17 agosto 2008

Poemas de MANUEL DA FONSECA, 29-8-2008, 21 horas

Poema da menina tonta
.
A menina tonta passa metade do dia
a namorar quem passa pela rua,
que a outra metade fica
pra namorar-se ao espelho.
A menina tonta tem olhos de retrós preto,
cabelos de linha de bordar,
e a boca é um pedaço de qualquer tecido vermelho.
A menina tonta tem vestidos de seda
e sapatos de seda,
é toda fria, fria como a seda:
as olheiras postiças de crepe amarrotado,
as mãos viúvas entre flores emurchecidas,
caídas da janela,
desfolham pétalas de papel...
No passeio em frente estão os namorados
com os olhos cansados de esperar
com os braços cansados de acenar
com a boca cansada de pedir...
A menina tonta tem coração sem corda,
a boca sem desejos,
os olhos sem luz...
E os namorados cansados de namorar...
Eles não sabem que a menina tonta tem a cabeça cheia de farelos.

.
Manuel da Fonseca

12 comentários:

Manuel Nunes disse...

Os meninos tontos
(ou talvez não)
têm colarinhos engomados
e calças vincadas
por mãos de meninas
tontas
que são fadas do lar
muito fadas e pouco meninas
boas na cozinha
más
muito más
naquilo que se sabe.

Os meninos tontos
(ou talvez não)
não precisam
das meninas tontas
para aquilo que se sabe.

Fora de casa
há muitas meninas
que não são tontas
porque não engomam
nem vincam calças
nem fazem a comidinha
dos tais meninos.

Por tudo isto é que eu gostava
que o Poeta falasse menos
das meninas tontas
e mais
dos tontinhos
(ou talvez não)
que vivem com elas.



Marta S.

endríago apaixonado disse...

Boa, Marta, assim é que é falar!

Manuel Nunes disse...

Marta S.,
Este nome e o teu interessante poema, fizeram-me recordar uma canção que se ouvia muito nos anos setenta. Música de José Mario Branco e letra de Sérgio Godinho:

"Chamava-se ela Marta
Ele Doutor Dom Gaspar
Ela pobre e gaiata
Ele rico e tutelar
Gaspar tinha por Marta uma paixão sem par
Mas Marta estava farta mais que farta de o aturar
- Casa comigo Marta
Que estou morto por casar
- Casar contigo, não maganão
Não te metas comigo, deixa-me da mão

Casa comigo Marta
Tenho roupa a passajar
Tenho talheres de prata
Que estão todos por lavar
Tenho um faisão no forno e não sei cozinhar
Camisas, camisolas, lenços, fatos por passar
- Casa comigo Marta
Tenho roupa a passajar
- Casar contigo, não maganão
Não te metas comigo deixa-me da mão

Casa comigo Marta
Tenho acções e rendimentos
Tenho uma cama larga
Num dos meus apartamentos
Tenho ouro na Suíça e padrinhos aos centos
Empresto e hipoteco e transacciono investimentos
- Casa comigo Marta
Tenho acções e rendimentos
- Casar contigo, não maganão
Não te metas comigo deixa-me da mão

Casa comigo Marta
Tenho rédeas p'ra mandar
Tenho gente que trata
De me fazer respeitar
Tenho meios de sobra p'ra te nomear
Rainha dos pacóvios de aquém e além mar
- Casas comigo Marta
Que eu obrigo-te a casar
- Casar contigo, não maganão
Só me levas contigo dentro de um caixão"

Mas afinal quem és tu, rapariga?

Manuel Nunes disse...

Meu Caro endríago:
A sua lendária reputação não aconselharia o convite que agora lhe faço: se estiver por perto, apareça no dia 29 na nossa Comunidade. A verdade é que não temos por lá nenhum desses espécimes que lhe são tão apetecíveis. Portanto não há perigo. Além de que sempre me sensibilizaram os seres apaixonados.
Vá, surpreenda-nos.
Manuel

endríago apaixonado disse...

Não se assuste, Leitor MANUEL, estou completamente retirado das lides. Até os dentes já me começaram a cair. Quanto ao convite, não posso aceitar. É que me custa imenso comparecer perante gente tão civilizada.

simplesmente Maria disse...

Caro Manuel: Se calhar sou capaz de aparecer lá na sua (vossa) comunidade de leitores. Moro em Carcavelos, estou perto. Tenho 29 anos,faço poesia e gosto muito de Florbela Espanca e da Marquesa de Alorna. Estou certa que vou encontrar uma comunidade (família) de gente jovem e com gostos iguais aos meus. Vejo estes poemas e não resisto a colocar aqui um de minha autoria. Eu só escrevo sonetos. É um estilo muito diferente destes poemas modernos (mas belos). Toda a minha poesia é muito erótica, sempre à volta do Amor. Aqui vai:

Naquela tarde em que partimos
em busca de deleites proibidos
e puros como terra,areia ou limos
conhecemos o fogo dos sentidos;

naquela tarde que em nudez sentimos
o sussurro de vozes e gemidos
e nas asas de Eros construímos
um sonho de desejos pressentidos;

naquela tarde fomos suor e sangue,
alma, carne, volúpia e grito,
louco galope em dorso de mustangue.

Por isso te busca este ser contrito
agora que sei distante e exangue
o belo amor que se tornou precito.


(Espero não ter falhado a métrica.)

Saudações poéticas,

Manuel Nunes disse...

Maria:
Acabei de ler a sua mensagem. Sim, apareça na nossa comunidade (ou família) que nem imagina o prazer que nos dá. Vai lá encontrar umas tias muito queridas, uns sujeitos já a darem para avozinhos e, com sorte, até um irmão mais novo.
Quando ao seu soneto, sabe, temos de ter cuidado quando nos movemos nos canteiros da poesia para não pisarmos nenhuma flor. Mas gostei, sim senhora. A métrica,assim à primeira vista, parece-me boa, e nota-se bem que não usou como muleta o dicionário de rimas.
Belo momento deste blogue que tem andado um pouco apagado mas que agora, finalmente, está pujante de comentários.
Até dia 29.
Manuel Nunes

Manuel Nunes disse...

Marta,

Os tontos ou que se fazem passar por, encontrarão sempre uma mão cansada, uns pés arrastados, um coração apertado, uma boca silenciada que vincará as calças com as lágrimas derramadas.

Resista Marta!
Graça Conceição

Manuel Nunes disse...

Endríago Apaixonado

Não pode estar a falar verdade. Só o seu nome, Endríago, inspira a verdadeira aventura; um voo de águia sobre uma escarpa íngreme; uma dança ao entardecer na areia molhada de uma praia desconhecida; uma fuga por entre os perigos da floresta...
E, depois, é Apaixonado! Ora, um Apaixonado nunca se retira!

Até breve
Sílfide

reaccionário impudente disse...

Estimada Sílfíde:
Vi o seu comentário dirigido a esse tal "endríago apaixonado" e creia que é com grande desconforto que me meto na conversa. Porém, a minha provecta idade (e alguma sabedoria!) não me aconselham o silêncio.
"Endríago" é um devorador de virgens. Basta consultar qualquer boa enciclopédia para lhe ficarmos a conhecer os atributos.
Assim, não sei onde foi buscar essa figura do "voo de águia sobre uma escarpa íngreme", como se a criatura, com tal currículo, fosse flor que se cheirasse.
Como acérrimo defensor da virgindade, do poder paternal e da honra das famílias, não posso aceitar os actos criminosos desse constumaz deliquente!
Já que falou de voos de águia, sempre lhe digo que conheço bem a que costuma voar no Estádio da Luz, além de uma sua prima, a águia de Bonelli, uma espécie ameaçada. Sou um amante do futebol e da vida natural.
Se quiser ficar a saber quase tudo sobre a espécie aquilina, aconselho-a a ler o conto "Diálogo com uma Águia" do escritor António Patrício (1878-1930). Faz parte da colectânea "Serão Inquieto". Deve haver aí na sua biblioteca.
Verá que não tem nada a ver com o tal endríago (duvido que esteja apaixonado).
Com os meus cumprimentos, sempre ao dispor,

reaccionário impudente disse...

ERRATA DO ANTERIOR COMENTÁRIO:

Onde se lê "Sílfíde" deve ler-se "Sílfide".

Onde se lê "constumaz" deve ler-se "contumaz".

Manuel Nunes disse...

Exmº Senhor Reaccionário Impudente


Não o conheço mas provavelmente isso também nunca acontecerá porque a sua idade será mesmo muito provecta...

E,educadamente, lhe digo que os Endriagos não são esses terríveis seres mitológicos, (que, como o nome diz, nunca existiram... as virgens, sim, mas agora há poucas, felizmente...) são seres sensíveis e, principalmente, tímidos, porque reconhecem a superior genética feminina. Por isso não sabem como abordá-las, sentem-se perdidos, afastam-se delas e eu tentei ajudar o Endríago Apaixonado falando-lhe assim, com poesia, para que ele não receasse, para lhe dizer que era bem-vindo à nossa Comunidade.

Temo, agora, que as suas palavras bafientas("acérrimo defensor da virgindade, do poder paternal e da honra das famílias", "amante do futebol"...)o tenham assustado e afastado para sempre.

Cumprimentos,
Sílfide