31 dezembro 2022

Balanço Anual e Feliz Ano Novo

 

Imagem daqui 

O ano de 2022 chegou, ainda sob a tempestade pandémica do Corona vírus, mas já com alguma luz ao fundo do túnel. O sucesso da vacinação, aliado à menor perigosidade das mutações do vírus, apontavam no sentido de um cenário endémico.

Para o 1º trimestre, sob o tema “Horas do Conto”, janeiro trouxe os “Contos Exemplares” de Sophia de Mello Breyner Andresen. Estiveram presentes 19 participantes, dos quais, apenas 1 não leu o livro. Este, reúne sete contos de alguma temática recorrente em Sophia, nomeadamente os valores cristãos e a repressão salazarista. As histórias são apresentadas, não de forma agressiva, mas subtilmente, quase com encanto e algum misticismo e sobretudo com muitas metáforas, onde Deus e o Diabo ou o Bem e o Mal, se escondem nas diferentes personagens. Dadas as contribuições de todos os presentes, confirmou-se o interesse e o agrado geral nesta leitura.

Em fevereiro lemos “Histórias de Mulheres” de José Régio. A sessão realizou-se no dia 25. No dia anterior, a Rússia invadiu a Ucrânia o que, não sendo propriamente uma surpresa, deixou o mundo em estado de choque. Ninguém queria acreditar numa guerra há muito anunciada.  Afinal o Homem continua a não aprender com os erros e a esquecer rapidamente a História…

Numa sessão que contou com 18 presenças e onde mais uma vez só uma pessoa não leu o livro, a coletânea de contos de Régio proporcionou mais uma reunião animada e participada. Estávamos perante um ambiente ficcional dominado por personagens femininas, cuja acção se desenrola nos anos 30/40 quer em meio rural quer em meio citadino. Todo um conjunto de mulheres ora apresentadas em contexto individual (com uma conduta mais fechada, particular e por vezes grotesca), ora em contexto colectivo (socialmente mais vazias, fúteis e dominadas pela aparência). Todas estas figuras construídas com mestria e a dar forma a histórias curiosas que agarraram os leitores, levando cada um à sua própria interpretação.

Em março terminámos o ciclo dedicado aos Contos, com a Agustina Bessa-Luís e os seus “Contos Impopulares”. Estes contos (catorze), ora muito pequenos ora quase a roçar uma história mais profunda, apresentam um traço comum: uma certa tendência de decomposição. Metáfora para uma sociedade decadente?

Vinte e um membros presentes numa sessão em que foi dito, por exemplo, que: “ler Agustina é como ler uma língua estrangeira”, “as palavras são o corpo das suas ideias”, “mesmo não sentindo uma empatia especial, há que reconhecer a genialidade da sua escrita” ou “é de uma leitura difícil mas, absolutamente cativante”.

Em abril iniciámos o 2º trimestre, sob o lema “A sul da américa, a oeste do sonho”. O autor escolhido para este mês foi Luís Sepúlveda e os seus romances “História de uma Gaivota e do Gato que a Ensinou a Voar” e “O Velho que Lia Romances de Amor”.

Zorbas, o gato grande preto e gordo e o seu bando de amigos gatos, unem-se num maravilhoso espírito de grupo, para educar e ensinar a voar, a pequena gaivota Ditosa, órfã de Kengah, a sua mãe vítima de uma maré negra. A este grupo junta-se no final um humano “O Poeta”, que dá a ajuda final ao voo inaugural de Ditosa. Sentimentos bonitos como a amizade, lealdade, companheirismo, proteção, confiança, coragem e responsabilidade, entre muitos outros, são a tónica dominante no conto.

“O Velho que lia romances de amor”, fala-nos da paixão pela leitura e é um hino ao amor pela Natureza e sobretudo à floresta Amazónica. António Bolivar não sabia escrever, mas sabia ler. Os seus pertences mais queridos eram dois: uma dentadura postiça e uma lupa que o auxiliava na leitura, dos seus amados romances de amor.

A escrita maravilhosa de Sepúlveda encantou-nos por inteiro. Nesta sessão em que foi finalmente liberada a obrigação imposta pela Pandemia do uso de máscara e em que voltámos a ver por inteiro a cara uns dos outros, estiveram presentes 19 leitores, tendo todos lido os dois livros.

O mês de maio trouxe-nos Mark Twain e as Aventuras de Huckleberry Finn. Descer o Mississipi, primeiro numa canoa, depois numa balsa e logo a seguir numa jangada, percurso constantemente embrulhado em aventuras e desventuras, foi a tarefa a que se propôs Huck, que encontrou no fugitivo escravo Jim, um inesperado companheiro de viagem. Parecendo um romance direcionado para os jovens, ficou a dúvida se estes terão a devida maturidade para entender o mesmo. Catorze presenças e um que não leu, foi a estatística registada.

A fechar o trimestre descobrimos em junho o escritor colombiano Juan Gabriel Vásquez e uma história que nos levou ao mundo dos emigrantes alemães chegados à Colômbia alguns anos antes da II Guerra Mundial. “Os Informadores” é uma história que nos fala de memórias, de dilemas éticos, de culpa, de invasão do passado no presente e sobretudo de redenção e perdão. Numa sessão em que estiveram presentes apenas 13 elementos, dois dos quais não leram o livro, o romance de Vásquez foi bem acolhido tendo proporcionado ótimos momentos de leitura.

 

No terceiro trimestre e de acordo com o tema “Há mais Mundos”, escolhemos livros de que toda a gente fala, mas que muitos nunca leram. Em julho “As Viagens de Gulliver”, de Jonathan Swift e em agosto “Alice no País das Maravilhas” de Lewis Carroll, transportaram-nos a mundos de fantasia e sonhos. O primeiro é uma espécie de comédia incompreendida e o segundo aproxima-se de uma narrativa com carácter de absurdo, sempre a contornar as regras da lógica. Cerca de uma vintena de participantes em ambas as sessões, divertiram-se a escrutinar setas fantasiosas aventuras. Em setembro, o grande clássico da ficção científica “A Guerra dos Mundos”, de H. G. Wells, deu luta na discussão, enriquecida pelas diferentes opiniões dos leitores presentes. Uma conclusão comum foi a de que, o ser humano perante o desconhecido, o medo e a histeria coletiva, perde a sua humanidade e pode tornar-se selvagem. Dezanove leitores presentes, tendo todos lido o romance.

Com outubro chegou o 4º trimestre, sob o mote “Saramago e Saramaguianos”. Iniciámos com o “Manual de Pintura e Caligrafia, de José Saramago”, discutido numa sessão onde estiveram presentes 20 leitores e apenas um, não leu o livro. Embora este seja o segundo romance de Saramago é já um tratado de bem escrever, um longo caminho de autoconhecimento e uma viagem pelo mundo da arte. Ninguém ficou indiferente à beleza da escrita e à sua peculiaridade. Diz o narrador em determinado momento “…É sobretudo a ideia do prolongamento infinito que me fascina…” A nós, o romance fascinou-nos do início ao fim.

Em novembro lemos “Os Malaquias”, de Andréa del Fuego. Acompanhámos a insólita história da família Malaquias, numa paisagem rural transformada pela construção de uma barragem. Romance áspero, mas ao mesmo tempo poético, salpicado de algum realismo mágico, onde a morte anda de mãos dadas com a vida. Dezassete leitores presentes e todos leram o livro. Uns ficaram encantados outros nem tanto, o que, como sempre, apenas serviu para enriquecer a discussão.

Dezembro chegou e com ele o último livro do ano “Os Transparentes”, de Ondjaki. Uma história centrada num prédio de Luanda, onde, quer os seus habitantes, quer quem por lá passa, enfrenta a dura realidade diária, entre uma alegria genuína e uma melancolia persistente. Os dramas de cada um cruzam-se com os dramas alheios, criando um complexo enredo de histórias impensáveis. Uma escrita lírica, mas mordaz e satírica, a revelar a realidade quotidiana da cidade e das suas pessoas. Ficou a pergunta: quem são os transparentes? Aqueles que pela sua insignificância não são vistos ou aqueles que pela sua pobreza se tornam invisíveis? Dezassete pessoas presentes, cinco que não leram ou ainda com a leitura em curso. Um livro que foi do agrado de todos os presentes.

E foi assim mais um ano rico de partilhas literárias, sempre com muitos leitores presentes, confirmando que a Comunidade de Leitores está viva e recomenda-se. À nossa Biblioteca e aos seus responsáveis, o nosso agradecimento pela disponibilidade do espaço e apoio permanente.

A todos um Feliz 2023!

24 dezembro 2022

Feliz Natal

 

“Winter Landscape with a Bird Trap” - Pieter Brugel, O Velho – 1565


Feliz Natal!


02 dezembro 2022

30 de Dezembro – Os Transparentes, de Ondjaki às 20h00

 


“…entrei nesse prédio

uma frescura é que me molhou a pele, conheço bem a zona e nunca tinha sentido esta frescura, vi uns degraus partidos e pensei que era melhor não pisar, saltei, subi mais, as conchas no meu saco faziam mais barulho, só que o meu coração me dizia para subir, continuei,…”

in “Os Transparentes” de Ondjaki