Edward Hopper “Morning Sun” 1952
Um dia de cada vez
Acordou cedo, muito antes do despertador tocar e ficou ali a pensar na vida. Anos de luta, com um espírito optimista. Sempre à espera que as coisas tendessem a melhorar. Um dia percebeu que não seria assim, mas o contrário. A situação iria degradar-se aos poucos. E começou a sentir aquilo. Chegou devagarinho. Um pouco de ansiedade aqui, uma certa angústia ali, a inércia a instalar-se. Tentava resistir-lhes, mas era tão difícil. Tudo em si pedia o contrário. Uma voz dizia-lhe que se deixasse ir. Era um ser humano, não podia resistir sempre. Era compreensível, afinal corria tudo tão mal. Mas lá no fundo um sentimento inato resistia. Não te entregues. Sabes que és fundamental na vida deles. Precisam de ti. Não importa que não entendam. Não têm culpa disso, tu sabes. É mais forte do que eles. Lembra-te dos momentos bons. Do abraço inesperado, do carinho no olhar, no agradecimento infantil. E lá vinham mais umas forças e mais um dia passava. E então compreendeu. Seria sempre assim, um dia de cada vez. Hoje melhor, amanhã menos bom. Viver intensamente os bons momentos e esquecer rapidamente os maus. Sempre tinha sido assim e assim sempre seria. Não havia motivo para mudar. A vida era tão curta. Levantou-se, abriu a janela e ficou uns minutos a olhar o horizonte. Uma bola de fogo subia lentamente nos céus. A aurora trazia um turbilhão de cores indescritíveis, violetas, rosas, laranjas. Mais um magnífico nascer do sol. Sentiu-se feliz perante tanta beleza. E lá foi viver mais um dia de cada vez…
(Custódia - Maio de 2008)
5 comentários:
Estava a ler e a tentar lembrar-me em que livro já tinha lido este texto, a meio percebi que não tinha sido num livro!
Gosto muito!!!
Zé, bem vinda!
Lembraste-te :)
Belo texto inaugural. Sente-se bem para que queres as palavras.
a beleza que te rodeia tb nos ilumina
etelvina
Belo! Comunidade, está a ficar mais completa. Boa mesa para boas palavras.
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