A abrir o conto sem nome ou chamado apenas "?"
"O meu quarto na hospedaria
Fra Giaccomo em Smirna, era uma gaiola de vidro suspensa sobre o mar, e isso
concorreu muito para que eu aí me demorasse mais do que projectara. Não que o
panorama fosse risonho; bem pelo contrário. A desarmónica imensidade do golfo,
a disposição das esmagadoras montanhas vizinhas, a cidade que não brilha, com o
seu casario escuro apinhado nas encostas, nas alturas recortadas de ameias,
restos de arruinadas fortificações antigas, todo este conjunto formava um
quadro melancólico. E a pretensiosa fachada italiana da cidade (existiria ela ainda?) que levantaram sobre o cais, a semelhança de Messina, era mais um engano
que a ninguém alegrava nem contentava. Depois, a situação moral dos habitantes
(domínio de dez mil turcos sobre trezentos mil italianos, gregos, arménios e
judeus), os receios, os terrores mal disfarçados da população cristã, a qual
dir-se-ia que julgava próxima e inevitável a chacina exterminadora com que os muçulmanos
a ameaçavam, diariamente e sem rebuço, junto a uma profunda crise económica,
alimentavam a atmosfera de tristeza que a paisagem, com os seus inúmeros
ciprestes, por seu turno acentuava..."
in "Novelas Eróticas" de Manuel Teixeira-Gomes
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