Comprei o livro, talvez em 72, depois de saber do filme. 44 escudos, preço inscrito a lápis na 1ª página. Devo dizer, porém, que só li algumas passagens da Cena Trimalchionis... Estou, portanto, praticamente em branco, e só começarei a ler na próxima semana. Tão bom termos nas estantes estes livros em pousio!
E eu a pensar que ninguém se atrevia a pôr aqui o filme! Depois digam-me se o conseguiram ver por inteiro! Outra coisa interessante: o nosso proponente não conhece ainda as vertentes caleidoscópicas (o João vai gostar da frase)do texto (nem lhe chamo livro--porque será?). Mas, já agora, em quantos de nós ecoou o Quo Vadis da adolescência???
Minha Amiga, com que então a blogar! O proponente não conhece as vertentes, nem os planos inclinados, nada, absolutamente nada! É feito de barro como os demais. Tem uma data de livros que nunca leu, metros de estante que não lhe entraram pelos olhos. Quo Vadis? Acho que fui ver esse filme ao Monumental, com a minha catequista e o pessoal da paróquia. Ah!, devo dizer, a minha catequista não fazia versos, mas falava-nos dos pecados capitais, das tentações da alma (Mundo, Demónio, Carne?). Venho agora do templo dos livros. Nem a Minha Amiga nem a sua Menina se encontravam lá.
Começando pelo fim: infelizmente, nem todos se podem dar ao luxo de pontificar quase todos os dias no Templo dos Livros, com a tapeçaria de Camarinha a adejar ao fundo, Camões e o seu Lusíadas, no conforto silencioso e alinhado do mobiliário de Daciano... Longe, muito longe, do Mundo, Demónio e Carne, triste trilogia de um cristianismo de pacotilha, há muito tempo saldado à revelia das catequistas tristes da infância. O Meu Amigo confessa--ainda ecos da catequese?--que não leu todos os livros--perdão, que há muitos livros que não leu. Inclusivamente--imperdoável--em vez de ler o Quo Vadis, foi vê-lo! Adivinhava a sua catequista que se tratava de uma obra menor ou tentava prevenir um mal maior? Enfim, conjeturas estas, de quem nunca teve uma dessas catequistas? Ou de quem nem sequer se dá conta da imensidão da sua própria ignorância?
Que belo diálogo meus amigos. Bem, sem catequistas (n/ andei na catequese: o meu pai n/ era crente na altura) eu li o Quo Vadis Domine?; tinha-o em casa, do acervo do meu pai e eu devorava tudo. Por essa época também li o Ivanhoe e a inevitável Jane Austen, que colhi nos metros da estante dele. Vivia, pois noutra era. E como se n/ bastasse vi os filmes todos: a Austen nas séries da BBC que por esses tempos passavam na nossa TV de canal único, o Ivanhoe, com a belissima E. Taylor e o dito Quo Vadis (talvez na TV, talvez no cinema?)também esse c/ o Robert Taylor (parece que era o galã de serviço) e outra beldade, a Deborah Kerr; gostei do Nero do Peter Ustinov. Sem episódios de catequistas, tenho um na aula de desenho: fiz um cartaz de Roma a arder, reproduzindo o do filme. Foi a minha obra de arte máxima, dada a minha falta de talento. Era relativamente fiel ao original e n/ fiquei mal vista. Do Petrónio, só me lembro do livro, mas n/ desgostava da personagem: esteta, amoral, mas n/ destituído de coração. Agora deparei-me com o Petrónio «real» (engraçado como uma figura tão pagã é repescada para uma obra tão cristã; a bem do plot histórico) e para complemento vou tentar ver o filme. Tentar...porque sou uma mulher do séc. XIX, como se vê pelas minhas leituras formativas...até chegar o Eça de Queirós e abanar o edifício. Enfim já lá vai muito tempo...
O século XIX foi um grande século, embora o Eça, em toda a sua "imoralidade" (essa de abanar o edifício é soberba!) trabalhasse, de facto, para a morigeração dos costumes burgueses. Nem adultérios, nem comportamentos sexuais desviantes, nem... Cuidado com as patologias sociais! Portanto, viva o Petrónio e o culto do deus Priapo! O Nero era feito no filme pelo Ustinov? O Petrónio de SienKiewicz dá-lhe o epíteto de "Barba-de-Bronze". :)
Pois, essa era a intenção do Eça, mas o que escreveu/sugeriu lá está... Para mim, adolescente, foi uma pedrada no charco, esse realismo, digamos, n/ tão literalmente priapico (isto existe?) . Mas aqui estamos perante n/ a «conversão» dos costumes, mas a subversão... Sim, o Nero do Quo Vadis era o Ustinov: gordinho, ridículo, pedante, inseguro, cruel, vaidoso...Acho que foi nomeado para o Óscar de melhor actor secundário.
Lembro-me do Ustinov, ator fabuloso, mas o Petrónio do livro era a minha figura de referência, talvez porque o autor lhe emprestava uma certa verve de Sócrates? Claro que eu na altura não raciocinava, limitava-me a disfrutar da leitura... Mas acho que tenho uma relação muito má com filmes de livros, que tento melhorar, desde há pouco tempo, com o Manoel de Oliveira... Julgo até que tenho alguma razão, porque se trata de uma relação pouco aprofundada, essa da literatura com o cinema, por vezes dúbia, sem cânone...
Também eu tenho uma relação algo conflituosa com filmes de livros: se vejo o filme primeiro, n/ me apetece ler o livro porque já conheço o enredo (em linhas gerais pelo menos); se leio o livro primeiro acho sempre o filme redutor, pois as obras literárias são imensamente ricas.Além disso a nossa imaginação fica «truncada» com as imagens. Mas quando deparo com uma boa adaptação fico muito satisfeita, especialmente se já li a obra e o filme n/ me retira o prazer de a descobrir. O que aconteceu, felizmente, com este Satiricon: se tivesse visto o filme em 1º lugar nem sei se pegaria no livro. Assim pude imagina-lo sem interferências do grotesco felliniano. Entretanto vou vendo o filme e adormeço a cada 45 minutos...
11 comentários:
Comprei o livro, talvez em 72, depois de saber do filme. 44 escudos, preço inscrito a lápis na 1ª página. Devo dizer, porém, que só li algumas passagens da Cena Trimalchionis... Estou, portanto, praticamente em branco, e só começarei a ler na próxima semana.
Tão bom termos nas estantes estes livros em pousio!
Paulinha
Estás uma expert nestas coisas!
Que belo complemento :)
E eu a pensar que ninguém se atrevia a pôr aqui o filme! Depois digam-me se o conseguiram ver por inteiro!
Outra coisa interessante: o nosso proponente não conhece ainda as vertentes caleidoscópicas (o João vai gostar da frase)do texto (nem lhe chamo livro--porque será?).
Mas, já agora, em quantos de nós ecoou o Quo Vadis da adolescência???
Minha Amiga, com que então a blogar! O proponente não conhece as vertentes, nem os planos inclinados, nada, absolutamente nada! É feito de barro como os demais. Tem uma data de livros que nunca leu, metros de estante que não lhe entraram pelos olhos.
Quo Vadis? Acho que fui ver esse filme ao Monumental, com a minha catequista e o pessoal da paróquia. Ah!, devo dizer, a minha catequista não fazia versos, mas falava-nos dos pecados capitais, das tentações da alma (Mundo, Demónio, Carne?).
Venho agora do templo dos livros. Nem a Minha Amiga nem a sua Menina se encontravam lá.
Começando pelo fim: infelizmente, nem todos se podem dar ao luxo de pontificar quase todos os dias no Templo dos Livros, com a tapeçaria de Camarinha a adejar ao fundo, Camões e o seu Lusíadas, no conforto silencioso e alinhado do mobiliário de Daciano... Longe, muito longe, do Mundo, Demónio e Carne, triste trilogia de um cristianismo de pacotilha, há muito tempo saldado à revelia das catequistas tristes da infância.
O Meu Amigo confessa--ainda ecos da catequese?--que não leu todos os livros--perdão, que há muitos livros que não leu. Inclusivamente--imperdoável--em vez de ler o Quo Vadis, foi vê-lo! Adivinhava a sua catequista que se tratava de uma obra menor ou tentava prevenir um mal maior?
Enfim, conjeturas estas, de quem nunca teve uma dessas catequistas? Ou de quem nem sequer se dá conta da imensidão da sua própria ignorância?
Maravilhoso! O humilde juízo de si mesmo. Veja o que ontem postei sobre o assunto -- ("(D)A Imitação de Cristo").
Que belo diálogo meus amigos.
Bem, sem catequistas (n/ andei na catequese: o meu pai n/ era crente na altura) eu li o Quo Vadis Domine?; tinha-o em casa, do acervo do meu pai e eu devorava tudo. Por essa época também li o Ivanhoe e a inevitável Jane Austen, que colhi nos metros da estante dele. Vivia, pois noutra era. E como se n/ bastasse vi os filmes todos: a Austen nas séries da BBC que por esses tempos passavam na nossa TV de canal único, o Ivanhoe, com a belissima E. Taylor e o dito Quo Vadis (talvez na TV, talvez no cinema?)também esse c/ o Robert Taylor (parece que era o galã de serviço) e outra beldade, a Deborah Kerr; gostei do Nero do Peter Ustinov. Sem episódios de catequistas, tenho um na aula de desenho: fiz um cartaz de Roma a arder, reproduzindo o do filme. Foi a minha obra de arte máxima, dada a minha falta de talento. Era relativamente fiel ao original e n/ fiquei mal vista. Do Petrónio, só me lembro do livro, mas n/ desgostava da personagem: esteta, amoral, mas n/ destituído de coração.
Agora deparei-me com o Petrónio «real» (engraçado como uma figura tão pagã é repescada para uma obra tão cristã; a bem do plot histórico) e para complemento vou tentar ver o filme. Tentar...porque sou uma mulher do séc. XIX, como se vê pelas minhas leituras formativas...até chegar o Eça de Queirós e abanar o edifício. Enfim já lá vai muito tempo...
O século XIX foi um grande século, embora o Eça, em toda a sua "imoralidade" (essa de abanar o edifício é soberba!) trabalhasse, de facto, para a morigeração dos costumes burgueses. Nem adultérios, nem comportamentos sexuais desviantes, nem... Cuidado com as patologias sociais!
Portanto, viva o Petrónio e o culto do deus Priapo!
O Nero era feito no filme pelo Ustinov? O Petrónio de SienKiewicz dá-lhe o epíteto de "Barba-de-Bronze".
:)
Pois, essa era a intenção do Eça, mas o que escreveu/sugeriu lá está... Para mim, adolescente, foi uma pedrada no charco, esse realismo, digamos, n/ tão literalmente priapico (isto existe?) . Mas aqui estamos perante n/ a «conversão» dos costumes, mas a subversão...
Sim, o Nero do Quo Vadis era o Ustinov: gordinho, ridículo, pedante, inseguro, cruel, vaidoso...Acho que foi nomeado para o Óscar de melhor actor secundário.
Lembro-me do Ustinov, ator fabuloso, mas o Petrónio do livro era a minha figura de referência, talvez porque o autor lhe emprestava uma certa verve de Sócrates? Claro que eu na altura não raciocinava, limitava-me a disfrutar da leitura... Mas acho que tenho uma relação muito má com filmes de livros, que tento melhorar, desde há pouco tempo, com o Manoel de Oliveira... Julgo até que tenho alguma razão, porque se trata de uma relação pouco aprofundada, essa da literatura com o cinema, por vezes dúbia, sem cânone...
Olá Amélia e restantes (sem desprimor :) ),
Também eu tenho uma relação algo conflituosa com filmes de livros: se vejo o filme primeiro, n/ me apetece ler o livro porque já conheço o enredo (em linhas gerais pelo menos); se leio o livro primeiro acho sempre o filme redutor, pois as obras literárias são imensamente ricas.Além disso a nossa imaginação fica «truncada» com as imagens.
Mas quando deparo com uma boa adaptação fico muito satisfeita, especialmente se já li a obra e o filme n/ me retira o prazer de a descobrir.
O que aconteceu, felizmente, com este Satiricon: se tivesse visto o filme em 1º lugar nem sei se pegaria no livro. Assim pude imagina-lo sem interferências do grotesco felliniano. Entretanto vou vendo o filme e adormeço a cada 45 minutos...
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