03 abril 2013

Das iguarias bizarras e da Ilíada em nova versão ou a extravagante ceia de Trimalquião



«(...) foi servido um conjunto de acepipes muito variados(...) sobre a baixela das entradas estava colocado um burro de bronze de Corinto com um duplo cabaz, contendo, um azeitonas verdes e, o outro, azeitonas pretas. Por cima do burrinho, duas travessas, dispostas em tecto, com o nome de Trimalquião e o seu peso em prata gravados nos bordos. Pranchas ligadas suportavam leirões polvilhados de mel e dormideira. Havia também salsichas ferventes numa grelha de prata e, por baixo da grelha, ameixas da Síria com bagos de romã.(...).»
«A estas palavras, quatro dançarinos avançaram ao som de música e tiraram a tampa da baixela. Vimos então, no fundo, aves de capoeira , tetas (sic) e, no meio, uma lebre ornamentada de penas, que a tornavam parecida com Pégaso. (...) nos cantos da baixela, quatro Mársias[ sátiros], segurando pequenos odres donde se escapava uma salmoura apimentada que escorria sobre peixes que nadavam nessa espécie de euripo. (...)»
« Um grupo de declamadores entrou imediatamente (...). Trimalquião sentou-se numa almofada e, enquanto os homeristas dialogavam em versos gregos (...) ele lia  o libreto latino, salmodiando. Depois, pedindo silêncio, disse:
- Sabeis que história estão eles a declamar? Diomedes e Ganimedes  eram irmãos. A sua irmã era Helena. Agaménnon raptou-a e ofereceu em troca, a Diana, uma corça. E agora Homero conta como os Troianos e os Parentinos andam em guerra. Naturalmente o vencedor foi Agaménnon e casou a sua filha com Aquiles.(...)»
[Um pouco mais tarde, após outros efeitos cénicos de grande impacto]:« (...) olhei para a mesa. Já aí tinham colocado uma bandeja com bolos; no meio erguia-se um Priapo de pastelaria, cuja veste (...) estava carregada de frutas de toda a espécie e de cachos de uvas.(...) Todos os bolos e todos os frutos, assim que foram tocados, começaram a deitar suco de açafrão e o jacto importuno chegou mesmo até nós.»

Petrónio, Satíricon, s.l., Europa América, 1973





3 comentários:

Manuel Nunes disse...

Ai o priapo de pastelaria! Grande especialidade!
Depois de "A Tempestade", não podia vir melhor.
Boas leituras!

Joca disse...

Paula, continua, ok?
Agora que tenho menos disponibilidade, tenho de louvar as tuas participações, assertivas, correctas, completas.

Paula M. disse...

Obrigada Joca :)
De facto a bonança n/ é grande neste Satyricon... a agitação é que é num tom (muito) diferente. Mas também «Estes romanos são loucos!». Quanto a Priapos de pastelaria...havia uns análogos em Amarante, lembram-se? Ai estes cultos pagãos que insistem em permanecer!