01 novembro 2024

“Pura Memória” de Emília Amor - 29 Novembro às 20h00


O livro deste mês, foi-nos proposto pela nossa Biblioteca (BSDR), que gentilmente ofereceu os livros aos leitores desta Comunidade.

 No site da “Cultura Cascais”, pode ler-se:

“Pura memória é uma narrativa biográfica mas também ficcional, que abrange um período de quatro anos – 1952 a 1956 – vividos em Caparide, aldeia do concelho de Cascais, onde a autora residiu até aos dezoito anos.

Emília Marçal Amor, professora e autora de algumas publicações das quais se destacam Didática do Português – Fundamentos e Metodologia e Littera - Escrita, Reescrita, Avaliação. Um Projecto Integrado de Ensino e Aprendizagem do Português - Para a Construção de uma Alternativa V, apresenta-nos nesta narrativa uma genuína imersão de uma criança citadina num meio contrastante, então acentuadamente rural.

São estas memórias, de um período da história de Caparide e da freguesia de São Domingos de Rana, para as quais praticamente não existe informação escrita que urge conhecer, preservar e transmitir às gerações vindouras numa política de valorização, salvaguarda e proteção do nosso património imaterial coletivo.”

29 outubro 2024

A Festa de Babette, um pequeno ensaio

 

(Cena do filme "A Festa de Babette" de Gabriel Axel)

Na sessão da passada sexta-feira, fomos brindados com um excelente ensaio do nosso Coordenador Manuel Nunes, sobre o conto "A Festa de Babette". Aqui fica para quem não pôde estar presente e também para uma releitura mais atenta dos que por lá estiveram...

"De acordo com um preceito que remonta a Horácio, poeta latino do século I a.C., o texto literário deve servir para instruir e deleitar. Ou seja, deve ser uma fonte de prazer para o leitor e cumprir, ao mesmo tempo, propósitos de natureza ético-pedagógica. Isto parece tão óbvio que quase escusava de ser dito a quem lê e partilha leituras numa comunidade de leitores. Temos então, repita-se, “instruir e deleitar”.       

Gonçalo Fernandes Trancoso, autor português do século XVI, publicou em vida a sua obra Contos e Histórias de Proveito e Exemplo cujo título, como é evidente, remete para essa função eminentemente ética e pedagógica da escrita literária em geral e do género conto em particular. 

O conto A Festa de Babette, de Karen Blixen, é isso mesmo, um conto de proveito e exemplo. Proveito por nos instruir sobre tantas coisas da vida, exemplo por nos indicar caminhos a seguir,

e isto sem deixar de nos deleitar pelos lances curiosos e engraçados com que nos deparamos ao longo do texto.      

Em A Festa de Babette temos uma história cujas principais personagens se dispõem como que em pentagrama: duas mulheres, dois homens e uma terceira mulher que é o eixo do enredo. Tanto as duas mulheres (as irmãs Martine e Philipa, filhas de um deão e profeta luterano da Noruega profunda) como os dois homens (o oficial hussardo Lorens Loeuwenhielm e o cantor Achille Papin da Ópera de Paris, apaixonados por cada uma das irmãs) se cruzam e entrelaçam com Babette Hersant, chefe de cozinha do Café Anglais de Paris e communarde activa nas barricadas de 1871, forçada depois ao exílio pelo fracasso da acção revolucionária.

Lembremos os dois apaixonados das irmãs. O primeiro não foi capaz de revelar o seu amor, seguindo como compensação uma ambiciosa e fulgurante carreira das armas; o segundo amou e revelou o seu amor mas, castigado pela rejeição, não logrou avançar na carreira artística: faltava-lhe a outra face de si, aquela que pelos dotes de cantora lírica completaria e daria sentido à sua arte.   

Tomemos as palavras do Salmo 85, citadas pelo deão e inscritas em várias passagens do texto:

«A Misericórdia e a Verdade se reuniram; a Virtude e a Ventura trocaram um beijo». 

Ultrapassando o sentido bíblico e cristão desta passagem do salmo, a Misericórdia deve ser entendida como o amor e a Verdade como a sua revelação. É desta forma que a Virtude e a Ventura se prestam a trocar um beijo. 

Com estas palavras do salmo se abre o discurso do General Loewenhielm na festa de Babette, sabendo-se que esse discurso é o resgate do seu passado rumo a um futuro marcado pelos valores espirituais. Diz-se no conto que no fim da sua carreira, com o peito repleto de medalhas, o general se preocupava com a alma. Mas não lhe chamemos alma, demos-lhe outros nomes: verdade, equilíbrio, paz, solidariedade, amor – estes os rostos múltiplos da alma, os seus mais belos rostos.  

E a graça, também referida pelo general como divina, o que é a graça? Alijada toda a carga religiosa e sobrenatural, a graça é aquilo que nos é revelado pela razão e pela inteligência emocional: a vontade de sermos justos, de não ofender ou maltratar os outros, de sermos humanos procurando os melhores caminhos para a felicidade. Era esta graça que o general quereria albergar em si. Por isso o seu discurso foi a melhor iguaria da festa de Babette, melhor que o amontillado, os blinis Demidoff, as cailles en sarcophage ou as uvas só comparáveis em excelência àquelas que os filhos de Israel encontraram no vale do Escol.

O melhor da festa foi também o desapego material de Babette, gastando os seus dez mil francos num jantar que foi um hino à vida e ao valor da amizade e da memória. Um jantar que reconciliou todos com todos e cada um consigo mesmo, ainda que no final não se lembrassem os membros da congregação dos pratos que haviam desfilado pela mesa. É o sensível dos sabores a ser ultrapassado pelos sentimentos do amor e da reconciliação.

Sim, porque é de reconciliação que se trata. Reconciliação de Babette com a sua arte, pois o título da última parte do conto é justamente “A grande artista”. Reconciliação com os nomes grados de nobres e burgueses que apreciaram a sua cozinha nos jantares do Café Anglais, esses inimigos de classe que combateu até ser derrotada nas barricadas de Paris. De acordo com o testemunho do General Loewenhielm, o Coronel Gallifer, frequentador habitual do Café Anglais, exaltava o génio culinário da chefe de cozinha, o romance de amor que escrevia em cada jantar em que punha a mão.  

Há um sentido alegórico em tudo isto: a arte é vida e pode a vida passar pelos transes mais difíceis sem que esmoreça o seu valor. A arte de Babette valia mais que os dez mil francos e ela provou-o. Porque a arte só é dinheiro para os artistas fingidos e enganadores, os que vendem e se vendem (as duas acções em simultâneo) sem atenderem ao espírito da criação do belo.

O hino dos irmãos da congregação continha dois versos nos quais se ouvem as palavras do Evangelho de Mateus, capítulo 7, versículos 9 e 10: «Irás dar uma pedra ou um réptil / ao teu filho que implora o alimento?»

Assim como diz o evangelista, também o artista deve dar o pão em vez da pedra, e o peixe em vez da cobra aos que buscam como alimento a sua arte.

Por tudo isto, A Festa de Babette lê-se com a enorme alegria de quem está na presença de um texto singularmente belo.

E para finalizar, uma pequena nota exclamativa: como este conto de apenas quatro dezenas de páginas é capaz de nos interpelar como não nos interpelam alguns grossos volumes de centenas!"

MJMN, São Domingos de Rana, 25-10-2024

01 outubro 2024

“A Festa de Babette” de Karen Blixen - 25 de outubro Às 20h00

 





O livro deste mês pode ser encontrado sob dois títulos diferentes

“Babette havia chegado só pele e osso, com o olhar de um animal acossado, mas neste novo ambiente de amizade em breve ganhou toda a aparência de uma criada respeitável e de confiança. Havia parecido uma pobre de pedir; revelou-se uma conquistadora. O seu rosto sereno, o seu olhar calmo e profundo, tinham propriedades magnéticas; sob aquele olhar as coisas moviam-se sem ruído e reocupavam os seus devidos lugares.

A princípio, as amas de Babette quase estremeceram, tal como acontecera em tempos ao Deão, à ideia de receberem em sua casas uma papista. Mas não estava naqueles temperamentos torturar com catequeses criatura tão sofrida; e, vamos lá, também não estavam muito seguras dos seus conhecimentos da língua francesa. Concordaram tacitamente que o exemplo de uma vida de boas luteranas seria o melhor meio de converter a criada. Deste modo, a presença de Babette nessa casa tornou-se, por assim dizer, um aguilhão moral para as suas moradoras…” 

In capítulo V de “A Festa de Babette” de Karen Bixen

01 setembro 2024

“Berta Isla” de Javier Marías - 27 Setembro às 20h00

 


Abri ao acaso e li:

“E assim se passou mais um ano e dois, três e quatro e cinco e seis. Desde que Tomás pôde contar-me parcialmente aquilo que na verdade fazia, passei a achá-lo mais despreocupado, mais descontraído, de melhor humor quando estava em Madrid; as mágoas e as insónias dele deixaram de ser constantes para se tornarem apenas temporárias, apareciam ou agravavam-se precisamente antes de ir para Londres e também as trazia consigo ao regressar, como se precisasse de tempo para se safar da sua outra vida, das suas outras vidas passageiras, mas provavelmente vividas com mais intensidade…”

In “Berta Isla” de Javier Marías

01 agosto 2024

“Praça do Rossio, Nº 59” de Jeannine Johnson Maia - 30 de Agosto às 20h00

 


Sinopse

Lisboa, abril de 1941. Em apenas nove dias, as vidas de uma mulher e de um homem mudarão para sempre. Vinda de Marselha, Claire, uma franco-americana de 17 anos, desembarca do comboio na estação do Rossio. À chegada, o seu caminho cruza-se - de maneira pouco agradável - com o de um jovem empregado do café Chave d’Ouro. Desenhador (e carteirista) nos tempos livres, António testemunha em primeira mão e tira partido dos conluios entre os espiões que se passeiam livremente pela capital portuguesa.

Enquanto aguarda pela família, na esperança de poderem partir juntos para os Estados Unidos, Claire vai à procura de duas crianças separadas dos pais à força e abandonadas à sua sorte, que transportam, sem saber, um segredo perigoso. António, chocado com o assassinato de um amigo, refugiado alemão raptado pela PVDE, tenta descobrir o responsável pelo crime. As investigações de ambos - e as suas vidas - vão cruzar-se, sem apelo nem agravo, à medida que descobrem que os desaparecimentos estão relacionados com um objeto que os nazis procuram em Lisboa. 

Numa cidade repleta de espiões, intrigas e traição, a posse de tal objeto pode representar uma sentença de morte. Mas pode ser bem mais angustiante ter de decidir entre o amor e o dever.

In “Praça do Rossio, Nº 59” de Jeannine Johnson Maia

01 julho 2024

“Justine” de Lawrence Durrell, 26 Julho às 20h00


 A abrir: 

“O mar está novamente agitado hoje, com rajadas de vento que despertam os sentidos. Em pleno inverno, a primavera começa a fazer-se sentir. Toda a manhã o céu esteve de uma pureza de pérola; há grilos nos recantos sombrios; o vento despoja e fustiga os grandes plátanos…

Retirei-me para esta ilha com alguns livros e com a criança – a filha de Melissa. Não sei porquê, agora ao escrever, penso nesta ilha como num «retiro». Os habitantes dizem por brincadeira que só um convalescente pensaria em vir procurar este lugar. Bem, para condescender, admitamos que sou um homem que procura curar-se…” 

In “Justine” de Lawrence Durrell

15 junho 2024

Encontros na Feira do Livro

Quando vais à Feira do Livro e dás de caras com uma companheira de leituras numa conversa sobre o que é "ser Poeta em Portugal", ficas a assistir e registas o momento. Aconteceu ontem. A Marta Meireles estava lá e foi apanhada em flagrante delito, por outras duas das nossas leitoras 😊

03 junho 2024

"Os Memoráveis" de Lídia Jorge - 28 de Junho às 20h00


Abri ao acaso e li: 

"...Esta é uma página prescindível. Ela relata um dia prescindível, uma acção prescindível. Eu não deveria ter voltado à Praia Grande e voltei. Voltei sozinha. Além do mais, voltei, conduzindo o carro argenté do meu pai..."

A abrir o capítulo XIII de "Os Memoráveis" da Lídia Jorge

01 maio 2024

“Os Meninos de Ouro” de Agustina Bessa-Luís - 31 Maio às 20h00




«Ousado sem ser original, José detesta compromissos, cedências, afasta os aliados, seduz os adversários. Não é essencialmente um governante, nem um tribuno, é alguém que carrega uma angústia, que se sente culpado sem ter feito nada de mal, que vê os obstáculos como castigos.»

(Do Prefácio de Pedro Mexia - “Os Meninos de Ouro” de Agustina Bessa-Luís)

01 abril 2024

“Portugal, a Flor e a Foice” de J. Rentes de Carvalho - 26 Abril às 20h00

 


O 2º Trimestre chega com a comemoração dos 50 Anos do 25 de Abril. Os autores foram escolhidos no âmbito desta comemoração. Assim, em Abril estaremos com “Portugal, a Flor e a Foice” de J. Rentes de Carvalho.

17 março 2024

Poesia nos Prazeres

Ontem tivemos mais uma atividade fora de portas: manhã de poesia no Cemitério dos Prazeres, onde homenageámos alguns dos poetas, ali eternamente residentes: Mário Cesariny, Jorge de Sena, Cesário Verde, Al Berto, António Ramos Rosa e Alcipe, Marquesa de Alorna. Com um programa bem delineado e coordenado pelo Manuel Nunes e pela Paula Silva, a quem todos agradecemos, para além de ficarmos a saber um pouco mais da vida daqueles poetas, foram ditos vários dos seus poemas pelos nossos inspirados leitores. Uma bonita manhã de quase Primavera que terminou com mais um salutar almoço convívio.

Poema

Em todas as ruas te encontro
em todas as ruas te perco
conheço tão bem o teu corpo
sonhei tanto a tua figura
que é de olhos fechados que eu ando
a limitar a tua altura
e bebo a água e sorvo o ar
que te atravessou a cintura
tanto tão perto tão real
que o meu corpo se transfigura
e toca o seu próprio elemento
num corpo que já não é seu
num rio que desapareceu
onde um braço teu me procura

Mário Cesariny

08 março 2024

A propósito do dia de hoje (8 de Março)

 

Mulher
 
A sociedade sempre foi macho
Que te agarrou pelo soutien
Te arrastou pelos cabelos,
Te despiu e violou,
Calou, imolou
Subjugou, manipulou
Condenou, negou,
Tendo a moral de anfitriã.
Duas castas te vestiam:
Ou senhora ou cortesã.
 
Séculos de mordaça
Pariram sufragistas;
Com fórceps de rasgão,
Amamentadas de sangue
Em seio alquimista
De ventre exangue
De poetisa, cientista,
Escritora, Ensaísta,
Médica, artista;
Vestidas de punhos cerrados
Debruados pela determinação
De desabotoar a camisa
E seduzir com o seu NÃO
 
Somos filhas dessas mães!
Mas a sociedade continua macho:
Macho alfa, poderoso,
Macho de membro ereto,
Macho de tom jocoso,
Macho que herda o passado, ardiloso,
E conjuga-o no politicamente correto.
Ah! Mas somos emancipadas!
Estamos a salvo! Vitória! Vitória!
Mas não é o fim da história…
 
Incendiámos soutiens!
Queimámos humilhação em público!
Hipotecámos ao voto a liberdade,
E conquistámos amanhãs,
Na promessa do amor bíblico
De sermos amadas em equidade.
 
Quando é que finamente teremos
O nosso seio a salvo?
Resgatada a essência do que se quiser
De feiticeira, de deusa, de vida,
De terra, de alma… De mulher?!
 
Emancipação…
Temos a sociedade à perna:
- Como assim?! Não quer estudar?!
- Como assim, doutoramento?!
 
- Como assim só quer ter filhos?!
- Como assim nem um rebento?!
 
- Como assim, tempo para educar?!
- Como assim, desnaturada, não vai sequer amamentar?!
 
- Como assim cansada para intimidade conjugal?!
- Como assim, oferecida, sempre em pecado carnal?!
 
- Como assim, é mãe solteira?!
- Como assim, vai abortar?!
 
- Como assim, que quer casar?!
- Como assim vai-se juntar?!
 
- Como assim, que desmazelo…
- Como assim, que pinta os olhos, e até pinta o cabelo?!
 
- Como assim, violentada, não faz queixa, não faz nada?!
- Como assim, divorciada?!
 
- Como assim, está na cozinha?!
- Como assim, que não cozinha?!
 
- Como assim, como assim, como assim?!...
- Uma vida inteira de tanta emancipação a provar?!
 
Hoje somos mães, senhoras, cortesãs,
Gestoras, poetisas, amantes, juízas,
Esposas, médicas, artesãs,
E o Ipiranga que nos resgatou à censura
Vestiu-nos com alta-costura
De uma liberdade de sermos TUDO!
TUDO! Com profissionalismo, beleza, desvelo e candura.
Mas… tudo… AO MESMO TEMPO!!!!!
 
A sociedade é que aperta o espartilho
E põe o dedo no laço da escravatura.
Mas que bem que nos assenta a emancipação!
 
In “Pó Ético” de Marta Meireles

29 fevereiro 2024

“Os Reinegros” de Alves Redol - 22 de Março às 20h00

 

A abrir

“Estava ali havia um bom pedaço vindo da esquina até defronte do prédio onde ela servia, enervado de esperar tantos minutos, pois já lhe assobiara o sinal combinado e ela ainda não aparecera, nem sequer à janela, aquietando-lhe a dúvida que começava a preocupá-lo.

Naturalmente dera-lhe trela naquele Santo António por desfastio ou porque a noite convidava à conversa. Abalara até ao Rossio, embora cansado do trabalho do armazém, mas mais cansado ainda dos maus modos dos primeiros-caixeiros, piores no trato do que os patrões, convencidos de que assim chegariam mais depressa a sócios da casa. Encaminhara-se para ali fugindo à solidão do quarto, que lhe aumentava as dores de cabeça que trazia do emprego. Tinham fechado mais cedo, porque os santos eram dias alumiados e, talvez também pelo hábito de sair só depois da uma hora batida, se sentira atraído pelo ruído da rua. Não procurara com quem acamaradar; escusara até, com um pretexto qualquer, a companhia de outro hóspede da casa, entristecido pelas saudades da sua aldeia de mistura com queixumes da vida. Mudara de fato e saíra, metendo no bolso umas moedas para beber o seu copo e arranjar, se calhasse, uma moça para passar o tempo, pois, em noite de bailaricos e fogueiras, as mulheres acessíveis são ainda mais fáceis…”

In “Os Reinegros” de Alves Redol

19 fevereiro 2024

Maiale - Torpedo Humano - a arma secreta da Regia Marina


Ao ler "O Italiano" do Arturo Pérez-Reverte fiquei extremamente curiosa sobre os Maiale. Já tinha ouvido falar sobre estes torpedos humanos, mas não tinha ideia de como funcionavam ou eram operados. Encontrei este pequeno documentário que é bastante esclarecedor.

15 fevereiro 2024

"FERREIRA DE CASTRO - UMA BIOGRAFIA"

 


Apresentação do 1º volume da biografia de FERREIRA DE CASTRO, autoria de RICARDO ANTÓNIO ALVES: Sábado, dia 17, às 16 horas na BIBLIOTECA MUNICIPAL FERREIRA DE CASTRO, OLIVEIRA DE AZEMÉIS.

09 fevereiro 2024

SESSÃO DE APRESENTAÇÃO DO ROMANCE DE CARLOS QUERIDO "ALEGAÇÕES FINAIS"

 

Alguns leitores da Comunidade estiveram na passada sexta-feira, dia 2, no Supremo Tribunal de Justiça. Cumpria-se a apresentação do romance de Carlos Querido a cargo do Juiz Conselheiro Henrique Araújo, presidente daquele Tribunal.

A intervenção de Carlos Querido integrou uma alusão à  Comunidade e à nossa participação em anteriores sessões sobre obras suas, nomeadamente as que tiveram lugar na Feira do Livro em torno do romance histórico “A Redenção das Águas” e da colectânea de contos “Habeas Corpus”.

De “Alegações Finais”, destacamos a lição de vida que o enredo contempla, a história de um advogado, filho de famílias humildes, que não obstante o triunfo profissional não logrou alcançar uma vida feliz face a desvios de carácter que lhe arruinaram o casamento. O romance desenvolve-se segundo um registo de escrita em que a voz do narrador se confunde com as das personagens e as suas correntes de consciência. Julgamos surpreender muitas das preferências artísticas, literárias e musicais do autor frequentemente trazidas ao curso da história. Claro que a actividade profissional de Carlos Querido (juiz desembargador) sente-se presente em todo um conjunto de termos e procedimentos jurídicos que, tratando-se o protagonista de um advogado, dão consistência ao discurso narrativo. Terão tido sucesso as alegações finais da infeliz personagem na sua tentativa de reganhar a harmonia conjugal? O romance não o diz, terminando de uma forma que permite considerá-lo como uma “obra aberta”.  


03 fevereiro 2024

LEITURAS

 


O DRAMA EM GENTE

 

Fingiram todos,

todos me fingiram

e em tradição me deram

fingimento

 

É certo que eram outros

tempos outros,

em que ser muitos

era coisa ausente

 

Mas todos me fingiram

e ensinaram

que o comboio de corda

pode ser

de corda a sério,

 

não de coração

 

Também eu tive,

embora em outra esfera,

outras noites de verão

 

Nada lhes devo

e em tudo, embora,

devedor lhes sou

 

Que os séculos agora

lhes dêem o sossego

 

ou dêem nada –

 

Ou nem que seja

a dor do universo,

como a dor de cabeça

 

infinita, silente,

de que padeço para  sempre

e desde

 

que eles vieram

visitar-me os sonhos

 

- ANA LUÍSA AMARAL, Escuro, 2014

 

 

AUTOPSICOGRAFIA

 

O poeta é um fingidor.

Finge tão completamente

Que chega a fingir que é dor

A dor que deveras sente.

 

E os que lêem o que escreve,

Na dor lida sentem bem,

Não as duas que ele teve,

Mas só a que eles não têm.

 

E assim nas calhas da roda

Gira, a entreter a razão,

Esse comboio de corda

Que se chama coração.

 

- FERNANDO PESSOA, Presença, nº 36, Novembro de 1932


01 fevereiro 2024

“O Italiano” de Arturo Pérez-Reverte- 23 de Fevereiro às 20h00


Abri ao acaso e li: 

“… Elena atravessou, está dentro da colónia. Fê-lo às primeiras horas, ao abrir da fronteira. Andou a fazer tempo nas proximidades enquanto tomava um café – mais chicória do que outra coisa – num pequeno quiosque situado junto da fronteira até que viu aparecer o doutor Zocas, que naquela manhã tinha servido no Colonial Hospital. Foi ao encontro dele com ar casual, que surpresa, doutor! Et cetera, e assim atravessaram junto a fronteira, a conversar com aparente naturalidade enquanto ela disfarçava a tensão: um olhar rotineiro dos alfandegários britânicos, uma saudação destes a Zocas, o longo percurso através da pista do aeródromo e Casemates Square até se despedirem na Main Street…” 

In “O Italiano” de Arturo Pérez-Reverte

01 janeiro 2024

“Um Deus Passeando pela Brisa da Tarde” de Mário de Carvalho – 26 de Janeiro às 20h00.

 


“…Brilha o céu, tarda a noite, o tempo é lerdo, a vida baça, o gesto flácido. Debaixo de sombras irisadas, leio e releio os meus livros, passeio, rememoro, devaneio, pasmo, bocejo, dormito, deixo-me envelhecer. Não consigo comprazer-me desta mediocridade dourada, pese o convite e o consolo do poeta que a acolheu. Também a mim, como ao Orador, amarga o ócio, quando o negócio foi proibido. Os dias arrastam-se, Marco Aurélio viveu, Cómodo impera, passei o que passei, peno longe, como ser feliz? Mara, mais além, borda, sentada numa cadeira alta de vime, junto aos degraus da porta. Há́ pouco, ralhava com as escravas. Agora ri-se com as escravas. Em breve ralhará com as escravas. Do local em que me encontro não consigo ouvi-la, mas quase adivinho as razões dos risos e dos ralhos. É-me agradável saber que Mara está perto, e reconhecer-lhe tão bem, desde há́ tantos anos, os trejeitos e os modos. Momentos atrás, sem nenhuma razão especial, veio até junto de mim, com o seu animal de regaço que é agora um gato cinzento, depois de, em hora nefasta, ter perdido a rola, muito alva, que lhe vinha comer à mão…”

In “Um Deus Passeando pela Brisa da Tarde” de Mário de Carvalho