Antígona, uma tragédia grega
de Sófocles, composta por volta de 442 AC. É a história da casa real de Tebas,
da família dos Labdácidas e uma das mais conhecidas da mitologia grega.
Blogue da Comunidade de Leitores da Biblioteca de S. Domingos de Rana - Cascais - Portugal
Antígona, uma tragédia grega
de Sófocles, composta por volta de 442 AC. É a história da casa real de Tebas,
da família dos Labdácidas e uma das mais conhecidas da mitologia grega.
Plano de Leituras 2026
30
de janeiro - O Amante, Marguerite Duras
27
de fevereiro - O Deserto dos Tártaros, Dino Buzzatti
27
de março - Meditações (ou Pensamentos), Marco Aurélio
24
de abril - Catarina e a Beleza de Matar Fascistas, Tiago Rodrigues
29
de maio - Averno, Louise Glück
26
de junho - Calamento, Romeu Correia
31
de Julho - Ratos e Homens, John Steinbeck
28
de agosto - Os Passos em Volta, Herberto Helder
25
de setembro - O Papagaio de Flaubert, Julian Barnes
30
de outubro - Visitar Amigos, Luísa Costa Gomes
27
de novembro - O Segredo de Joe Gould, Joseph Mitchell
18
de dezembro - Tudo sobre Deus, José Eduardo Agualusa
Realizou-se ontem dia 22 de novembro, em Almada, o 2º Encontro dos Grupos de Leitores da Rede de Bibliotecas Municipais da Área Metropolitana de Lisboa. Pela segunda vez, o Davide Freitas (Técnico da Biblioteca de Almada), convidou a nossa Comunidade a fazer-se representar, cabendo-me a mim, desta vez, o convite para estar na mesa.
O
encontro aconteceu na Biblioteca Central de Almada e foi integrado no programa
de comemorações do seu 28º aniversário.
Para
além da nossa Comunidade, estiveram presentes grupos e comunidades de leitores do
Barreiro, do Feijó, de Loures, da Maia, de Oeiras e da Quinta do Anjo (Palmela).
Cada participante fez uma breve apresentação do seu grupo de leitura, falando sobre a metodologia de funcionamento, bem como sobre a sua experiência pessoal enquanto leitor.
Ficou
evidente que as comunidades de leitores são muito mais do que simples clubes de
livros. Para além de espaços de diálogo, inclusão e pensamento crítico e são
oportunidades de conhecimento e descoberta em diferentes áreas, uma vez que a
propósito dos livros e das leituras, surgem várias formas de arte, cultura e
lazer.
O
encontro foi um agradável espaço de partilha, onde os membros e dinamizadores
dos diversos grupos de leitura, apresentaram as suas melhores práticas e desafios
enfrentados na dinamização das suas comunidades, tendo ficado mais uma vez
evidente, o potencial destas comunidades de leitores como catalisadores para o
fomento e dinamização dos livros e da leitura.
Obrigada
à Biblioteca Central de Almada, pelo entusiasmo com que organiza e incentiva
estes encontros de diferentes comunidades e grupos de leitores.
Os livros apresentam a vida e obra do escritor Ferreira
de Castro. Este primeiro volume foca-se nos anos de 1898-1919, detalhando a sua
trajetória desde uma infância marcada por dificuldades até à emigração para o
Brasil, que influenciou profundamente o seu percurso como jornalista e
escritor.
Sinopse
Maina Mendes é uma mulher
silenciada num mundo de homens e dos homens, que cedo
percebe na sua condição imposta, uma forma de a metamorfosear a seu favor: do
silêncio faz a sua resignada mudez.
Indicado para: combater processos de desumanização, injustiça, extremismo/fanatismo religioso, desigualdade, exclusão, ciúme, humilhação, ódio e formas diversas de violência; aliviar tiques de snobismo, arrivismo e excesso de correção política; amparar quadros de envelhecimento, luto, orfandade, saudade, solidão ou desenraizamento;
Efeitos secundários: recuperação de memórias remotas;
possível nostalgia; sentimentos de ternura, carinho, aconchego, solidariedade,
sororidade, empatia e compaixão; predisposição para a amizade, o amor, o
diálogo, o riso, o perdão e a paz; acréscimo de resiliência;
Posologia: Leitura de um conto por dia, à hora de almoço.”
O texto foi retirado da Bertrand Livreiros online, com a devida vénia!
Sinopse
Neste livro, Chico Buarque constrói uma saga familiar, caracterizada pela decadência social e económica, tendo como pano de fundo a história do Brasil dos últimos dois séculos.
Um homem muito velho espera a morte numa cama de
hospital. Membro de uma família tradicional, desfia, num monólogo dirigido a
quem quiser ouvir, a história da sua linhagem, desde os antepassados
portugueses ao avô que lutou pelo fim da escravatura.
Em pleno século XVII, num mundo misto de fantástica
sabedoria e de assustadora barbárie, um jovem estudante italiano viajava
tranquilamente de Veneza para Nápoles quando foi capturado por piratas turcos.
Após algumas voltas e reviravoltas do destino, torna-se escravo de um estranho
cientista turco , conhecido como o Mestre.
Este sábio, ávido pelo conhecimento científico e progressos intelectuais do
Oeste, procura, recorrendo ao diferente saber do prisioneiro, conseguir o seu
aperfeiçoamento intelectual e científico, e nos anos que se seguiram o escravo
ensina ao Mestre o que ele aprendera no velho continente, da medicina à
pirotecnia. Mas Hojas, o Mestre quer mais: quer saber o porquê de serem quem
são e até que ponto, uma vez desvendados e trocados os seus mais íntimos
segredos, as suas identidades não serão confundidas ou trocadas.
Sinopse
Tudo começa com uma panela de água, que Sy
Baumgartner – escritor de renome e professor de Filosofia à beira da reforma –
acabou de esquecer no fogão.
A vida de Baumgartner fora definida pelo seu
profundo amor pela mulher, Anna. Nove anos passaram desde que ela morreu
inesperadamente num bizarro acidente de natação, e Baumgartner continua a lutar
para sobreviver à sua ausência.
O romance de ambos é-nos então desvendado desde o
seu início, em 1968, quando Sy e Anna se conhecem enquanto estudantes falidos
em Nova Iorque, e segue a relação apaixonada que mantêm ao longo dos quarenta
anos seguintes.
Serão as memórias de Baumgartner coincidentes com as
de Anna, cujos textos autobiográficos ele decide agora ler? Porque é que nos
lembramos de certos momentos da nossa vida e esquecemos outros por completo? De
que são feitas as nossas histórias pessoais?
Excecionalmente, este mês a sessão realiza-se na última quinta feira do mês e não na sexta (dia feriado) como é habitual!
Sinopse
De débil constituição física e gago de nascença,
Mizoguchi é o único filho de um bonzo Zen. Ao longo de toda a sua vida,
sente-se diminuído e complexado por causa da sua gaguez, o que o leva a
isolar-se. Quando chega o momento vai estudar para bonzo no Templo Dourado, em
Quioto. Desde cedo preocupado com a Beleza, Mizoguchi vem a desenvolver com o
templo uma relação de dependência obsessiva, que constitui um outro obstáculo à
sua interacção com o mundo exterior. Para ele, O Templo Dourado era
a encarnação última e suprema da Beleza, conceito que esmaga toda a sua
existência. Com a Segunda Guerra Mundial e o Japão do pós-guerra como cenário,
O Templo Dourado é quase um monólogo interior que espelha a repressão e a
obsessão de Mizoguchi, das quais se vem a libertar num final perverso.
O poema “Liberdade”,
de Fernando Pessoa, datado de 16-3-35 (a 8 meses e meio da sua morte), teve a
1ª publicação no nº 526, de 11-9-37, da Seara
Nova, nessa página cuja imagem aí se reproduz.
Coisas estranhas que
nele se dizem ("Ler é maçada", "Livros são papéis pintados com tinta"), em especial por virem de um homem que se fartou de ler (e
escrever), renunciando aos prazeres da vida vivida e a compromissos do coração.
Uma existência excessiva de engenho e arte em que não houve lugar para outras
coisas.
Talvez passe por aqui
a interpretação (biografista e psicológica, desculpem lá) do poema, se é que é
passível de interpretação. Ainda que na dúvida, achamos que D. Sebastião e
Jesus Cristo estão ali só para atrapalhar o leitor ingénuo. Do que ele queria
falar era das flores, do sol e da música, elementos que se encontram com
facilidade (ou talvez não) na composição do amor.
O homem de carne e
sentidos que nele havia já tinha dado sinais da insatisfação. Veja-se o poema
“Dá a surpresa de ser”, feito sob injunção erótica da jovem namorada do mago ocultista Aleister Crowley que o visitara em 1930:
Dá a surpresa de ser.
É alta, de um louro
escuro,
Faz bem só pensar em
ver
Seu corpo meio maduro.
Seus seios altos
parecem
(Se ela estivesse
deitada)
Dois montinhos que
amanhecem
Sem ter que haver
madrugada.
E a mão do seu braço
branco
Assenta em palmo
espalmado
Sobre a saliência do
flanco
Do seu relevo tapado.
Apetece como um barco.
Tem qualquer coisa de
gomo.
Meu Deus, quando é que
eu embarco?
Ó fome, quando é que
eu como?
(Arquivo Pessoa, Obra
Édita, datado de 10-9-30)
E agora, cumpridas estas 10 publicações, vou embarcar para outras paragens. Legentes, por favor, não deixeis de fazer as vossas leituras, salvaguardando, claro, o mais que a vida dá.
Confesso com humilde
sinceridade ter aprendido imenso com as leituras feitas em comunidades de
leitores. Acho que partilho com muitos este sentimento pessoal e transmissível:
ler, por sugestão de outros, obras às quais não chegaria com facilidade.
Nem todos pensarão da
mesma maneira e ainda bem. Há os que têm a sua própria orientação literária
(diria mesmo a sua agenda), sejam ou não como o autodidacta de Sarte no romance
A Náusea. Admiro esses espíritos
fortes e independentes, admiro a sua superioridade de leitores.
Assim, venho para o
computador-máquina-de-escrever martelar estas palavras – que não são
interditas, como as do poema de Eugénio de Andrade – sob os efeitos do livro que
se apresenta aí no ápice da publicação e que vou lendo esta semana por
sugestão de bons confrades ledores. Não fossem eles e convenço-me de que só o
leria na eternidade, local, se assim lhe posso chamar, onde se consegue ler
tudo sem preocupações de tempo ou distância. É lá, certamente, que ainda
conseguirei ler Ulisses, de James
Joyce, e A Cidade de Deus, do Bispo
de Hipona, livros começados mas nunca acabados.
Até esses instantes supremos (instantes em sentido figurado, claro) é procurar ser feliz tanto quando for possível. Tenho-me sentido feliz, lendo os contos de Flannery O’ Connor.
Para certas pessoas, a
leitura é uma simples fonte de prazer, enquanto para outras é também formação,
autodidactismo. Já os antigos diziam que o fim da leitura seria o de deleitar e instruir. Ora aí está, isso
mesmo.
Assim começa esta
oitava publicação da “Educação Sentimental dos Legentes”, mas descansai,
leitores, que a coisa não passará do número dez. Será um decálogo sem moral nem
ética, dez mandamentos de quem não sabe mandar e, graças a Deus, é pouco mais
do que um pau mandado.
Hoje falar-se-á de autodidactas
em bibliotecas. Conhecemos alguns: o jovem Saramago da Biblioteca Galveias,
lendo Ricardo Reis convencido de que era um poeta de carne e osso; ou o
Ferreira de Castro, regressado da selva, estudando com afinco na biblioteca
pública de Belém do Pará. Cada caso é um caso.
Curioso é o daquele
autodidacta da biblioteca pública de Bouville (cidade imaginária) de que nos
fala Sartre em A Náusea. Já não me
lembro se o homem tinha nome, tão-pouco o que fazia para além de ler. Antoine
Roquentin (o historiador protagonista do romance) conheceu-o quando na
biblioteca fazia as suas investigações sobre uma qualquer personalidade de séculos passados.
Foi falando com ele e
apercebeu-se dos propósitos que o animavam. Fazer a sua formação, que já se
iniciara há sete anos, lendo todos os livros da biblioteca. O método era seguir
as leituras por ordem alfabética dos nomes dos autores. Começara na letra A e, imagine-se,
já ia na L, estudando os mais variados assuntos, da História e da Filosofia à
Zoologia e à Física Quântica.
Poderia ter seguido de
Z para A que dava o mesmo efeito, mas isso não interessa e aqui fica o caso para
vossa meditação.
Avisai-me, ó leitores,
se souberdes de algum autodidacta na nossa biblioteca. Teria grande prazer em
o conhecer, até de o convidar para se agregar à nossa Comunidade.
Foi redigido tendo
como referência a pintura Le Philosophe
lisant (1734), de Jean-Baptiste-Siméon Chardin (1699-1779) e é um discurso
sobre a importância e a nobreza do acto de leitura.
Tudo o que a pintura
nos mostra dá conta disso: o homem que lê vestido tal como se vai para uma
cerimónia; o silêncio que se imagina em torno dele, como se estivesse retirado
do mundo, entregue ao prazer supremo da leitura; a ampulheta e a pena sobre a
mesa com significativas conotações de ordem prática e simbólica.
A ampulheta, medidora
do tempo que é escasso para a leitura mas longo para a existência do livro e das
suas personagens. Diz-nos Steiner que «a
vida do leitor mede-se em horas e a do livro em milénios». E também que Flaubert
teria falado na hora da morte sobre o paradoxo de estar ele a morrer enquanto a
“prostituta” Emma Bovary, criatura sua surgida em simples folhas de papel,
continuaria a viver.
Depois a pena, hoje a
caneta ou o lápis com que o leitor toma as notas da sua leitura. Toda a boa leitura
supõe sublinhados, notas à margem, apontamentos em folhas de papel. «Ler bem é
estabelecer uma relação de reciprocidade com o livro que está sendo lido, é
embarcar em uma troca total», diz o autor do ensaio.
Mas afinal, caros
legentes, todos vós procedeis mais ou menos com estes princípios. Claro que há
as adaptações aos tempos modernos. Não vos imagino a vestir os melhores fatos
quando vos pondes diante dos contos de Flannery O´Connor ou dos romances de
Mishima.
E, por favor, nada de
riscar ou anotar as páginas dos livros que haveis requisitado na biblioteca.
Nem a lápis, que as borrachas são cada vez de pior qualidade e torna-se muito
difícil de apagar.
É a história de um fã
– como se diz hoje em linguagem informal – de romances policiais. Não lia,
devorava os romances, desejoso de chegar ao fim e conhecer o verdadeiro
assassino da pobre vítima entre as hipóteses avançadas ao longo do livro.
Tendo como profissão a
de maquinista do metropolitano e sendo tão grande a sua paixão pela leitura,
começou a levar os livros para o comboio, lendo-os sobre o tablier enquanto
efectuava as manobras de condução.
Claro que a coisa deu
mau resultado: não houve propriamente um acidente grave, mas falhas na
informação que pelos altifalantes deveria ser prestada aos passageiros sobre a
passagem pelas diversas estações da linha. Um passageiro percebeu a razão da
sua distração, fez queixa, e o bom do leitor-maquinista foi despedido.
Vem então o mais curioso:
absorvido pela necessidade de procurar emprego, passou apenas a ler anúncios de
jornal, não sendo capaz de voltar aos seus amados romances.
Moral da história:
para ler, temos de ter serenidade, temos de nos sentir bem connosco e com os
que nos rodeiam. A leitura não é uma terapia (para ajuda procurem os
psicólogos ou os bruxos), antes um exercício de pessoas saudáveis que estão bem
com a vida.
Pode haver quem pense o contrário. Há até mediadores de grupos de leitura que ufanamente se autoproclamam biblioterapeutas. Palavra estranha, não é? Mas eles lá saberão porque o dizem.
«Talvez não haja
outros dias da nossa infância que tenhamos vivido tão intensamente como esses
que cremos ter deixado sem os viver, esses que passámos com um livro
preferido».
Esta é a abertura do
texto Sobre a Leitura, de Marcel
Proust. O autor das memórias de Combray com os passeios pelos lados de
Méséglise e Guermantes (Em Busca do Tempo
Perdido), expressa-nos neste livrinho de 70 páginas aquilo que a leitura
pode dar – de prazer e de renúncia a outros prazeres – a quem,
permanecendo neste mundo, quer descobrir os mundos possíveis que se desdobram
triunfantes – umas vezes belos, outras aterradores – perante os prodígios da
imaginação.
O jovem leitor que
associamos a Marcel Proust aproveitava todos os momentos que lhe eram
permitidos para se isolar e se entregar à leitura, sendo por vezes admoestado
por se fechar no seu quarto, evitando os passeios e os convívios familiares.
A leitura é normalmente um acto de isolamento, de solidão. Por isso admiro os que conseguem ler nos transportes públicos – frequentemente lotados e ruidosos –, demonstrando uma capacidade acrescida de permanecerem sozinhos no meio de tantos. Estes serão talvez uns superleitores adaptados à velocidade e escassez de tempo dos nossos dias. Honra lhes seja feita, bem os conheço!
Ignorante que sou de
tantas e tão belas coisas, há semanas que venho fazendo a minha educação
sentimental de legente na cátedra camoniana de Jorge de Sena. Educação sentimental,
não sei se já se percebeu, porque a leitura é um sentimento. E Jorge de Sena,
engenheiro civil da Junta Autónoma das Estradas até se tornar no scholar de Assis, Araraquara, Madison e
Sta. Barbara (uma vida de professor pelo mundo em pedaços repartida) é também,
além disto tudo, poeta, contista e romancista, além de espírito de trato
difícil, agora só tangível em mediúnicos exercícios que não sei se há quem os
faça nem quero saber. Bem, estive no ano passado à beira do seu túmulo no Cemitério dos Prazeres, só isso, e
agradeço à companhia sentimental que me lá levou.
A imagem que acima se
apresenta é, como se vê, do Salmo 136 (137 segundo o número hebraico), súplicas
do povo exilado em Babilónia que Camões glosou nas redondilhas de Babel e Sião,
“Sôbolos rios que vão” ou Super Flumina
Babylonis (a que Jorge de Sena se referiu num conto de Novas Andanças do Demónio):
Sôbolos rios que vão / por Babilónia m´achei, / onde sentado
chorei / as lembranças de Sião / e quanto nela passei. / Ali o rio corrente /
de meus olhos foi manado, / e tudo bem comparado, / Babilónia ao mal presente,
Sião ao tempo passado. (…)
Um poetastro da nossa
praça atreveu-se a brincar com o assunto em poema dum seu livreco. Perdoai-lhe,
senhores, porque ele, se calhar, não sabia o que fazia.
E assim vamos andando. Muito tardia mas proveitosa (para mim) esta sessão de educação sentimental.
Há uns anos, após a
leitura de um livro de contos de um amigo (edição da Chiado ou outra qualquer
editora do género), exprimi a opinião de que a prosa era boa mas não estava
posta em estilo actual, fazendo lembrar os textos de Camilo ou Júlio Dinis. Respondeu-me
que sim, podia ser verdade, mas o que queria eu que ele fizesse se havia sido com
Camilo e outros do seu século que aprendera?
Milan Kundera tem um
conjunto de ensaios (“Consciência da continuidade”, desse livrinho aí na
imagem) em que é tratado o assunto do inactual em arte. Imaginemos, diz o
escritor, que era possível um virtuoso dos nossos dias compor uma sonata tão
perfeita como uma qualquer de Beethoven, de tal forma que melómanos apurados,
ao ouvi-la, arriscariam tratar-se de obra do grande compositor alemão. Ao
saberem, porém, que não era, que fora um extraordinário virtuoso contemporâneo
a criá-la, não deixariam de rir pela inactualidade do trabalho, reconhecendo-o não como obra de valor original, mas como um simples pastiche.
Isto diz respeito
também à poesia. Tenho falado com leitores que não gostam da poesia moderna
(alguns até não gostam de nenhuma poesia) e sentem que os versos rimados de
Augusto Gil ou João de Deus, quando não os de Guerra Junqueiro, é que lhes
enchem a alma.
Não está em causa a
poesia dos clássicos, isto é, daqueles poetas que por valor lograram romper o esquecimento que o
tempo sempre tece. Eles serão sempre os maiores! Ocorrem-me os nomes de Camões,
Sá de Miranda, Bocage, Quental… Poetas
com quem a poesia contemporânea dialoga com plena consciência do fenómeno da continuidade em arte. É o caso deste poema (“Minha
senhora de mim”) de Maria Teresa Horta. Ecoa nele um conhecido verso de Sá
de Miranda e aqui fica, também, em memória da autora:
Comigo me desavim / minha senhora / de mim // sem ser dor ou ser cansaço / nem o corpo que disfarço // Comigo me desavim / minha senhora / de mim // nunca dizendo comigo / o amigo nos meus braços // Comigo me desavim / minha senhora / de mim // recusando o que é desfeito / no interior do meu peito.
A questão do ensino da literatura não é assunto
desinteressante para os leitores do género romance, o mais presente nos
programas dos grupos de leitura, chamem-se eles clubes ou comunidades.
Flannery O´Connor
diz-nos que o foco da leitura de um texto de ficção deve ser posto na obra, naquilo que nela está,
fugindo-se às tentações não literárias de interpretação como a biografia ou a
psicologia do autor.
Na escola aprende-se
com o professor, nos grupos de leitura, se a mediação for eficaz, todos
aprendem com todos.
Lembremo-nos do que
Camões diz em Os Lusíadas: quem não
sabe de arte não a estima. Ora a ficção narrativa é a arte que, diferentemente
de outras artes, nos fala dos sentimentos, da vida e do que esperamos dela.
Aquela arte em que nós mesmos estamos metidos e que é forçoso compreender
para a estimar.
Façamos, pois, a nossa educação sentimental de leitores que só teremos a ganhar com isso.
O título O Romancista Ingénuo e o Sentimental corresponde a um conjunto de conferências proferidas por Orhan Pamuk em 2009 na Universidade de Harvard. Li-as há mais de dez anos, pouco depois da sua publicação em Portugal.
Falando de
romancistas, são também os leitores que estão sob o foco analítico do escritor
turco.
Temos assim o leitor
ingénuo e o sentimental, sendo que este é o leitor reflexivo, o que sente a leitura para lá do mero
entretenimento ou da devassa de vidas excepcionais proporcionadas pela arte do
romance.
Enquanto o leitor
ingénuo, desejoso de conhecer o desfecho dos enredos, abomina muitas vezes as
descrições demoradas e atribui menor importância à profundidade psicológica das
personagens, o leitor sentimental-reflexivo procura aquilo a que Pamuk chama o centro do romance, ou seja, a coerência
interna da obra, por vezes dissimulada no subtexto ou na propensão alegórica da
voz narrativa.
Uns e outros (leitores ingénuos e sentimental-reflexivos) partilham da enorme alegria de ler romances. Ambos se aceitam como sinceros e estimáveis, o que não significa que não tentemos fazer alguma coisa para os tornar melhores.
Do sul dos Estados Unidos
chegam-nos estes contos de uma profunda narrativa, de uma tensão permanente,
onde a incógnita do que vai acontecer é uma constante. Há uma oscilação
dramática entre o humor, o caricato e a violência. Flannery O’Connor tem o dom
de nos prender desde a primeira palavra até à última linha…
Data: 10 de janeiro de 2025 | 18h00
Local: Biblioteca Municipal de Sintra
Palavras Silenciadas: Histórias e Censura nos Livros
Proibidos
Uma conversa que explora o universo dos livros censurados
durante o Estado Novo, refletindo sobre o impacto da censura em autores,
leitores e liberdade de expressão a partir da análise das obras de dois
importantes escritores portugueses: Ferreira de Castro e José Régio.
Esta sessão contará com as seguintes comunicações:
∙ Ferreira de Castro, a censura e a autocensura -
Ricardo António Alves;
. José Régio e a censura - Manuel
Matos Nunes
Alguém
escreveu que este livro é uma fábula de "relato violentamente
satírico sobre a figura de Salazar". Vamos ler e perceber a razão desta opinião…