17 março 2024

Poesia nos Prazeres

Ontem tivemos mais uma atividade fora de portas: manhã de poesia no Cemitério dos Prazeres, onde homenageámos alguns dos poetas, ali eternamente residentes: Mário Cesariny, Jorge de Sena, Cesário Verde, Al Berto, António Ramos Rosa e Alcipe, Marquesa de Alorna. Com um programa bem delineado e coordenado pelo Manuel Nunes e pela Paula Silva, a quem todos agradecemos, para além de ficarmos a saber um pouco mais da vida daqueles poetas, foram ditos vários dos seus poemas pelos nossos inspirados leitores. Uma bonita manhã de quase Primavera que terminou com mais um salutar almoço convívio.

Poema

Em todas as ruas te encontro
em todas as ruas te perco
conheço tão bem o teu corpo
sonhei tanto a tua figura
que é de olhos fechados que eu ando
a limitar a tua altura
e bebo a água e sorvo o ar
que te atravessou a cintura
tanto tão perto tão real
que o meu corpo se transfigura
e toca o seu próprio elemento
num corpo que já não é seu
num rio que desapareceu
onde um braço teu me procura

Mário Cesariny

08 março 2024

A propósito do dia de hoje (8 de Março)

 

Mulher
 
A sociedade sempre foi macho
Que te agarrou pelo soutien
Te arrastou pelos cabelos,
Te despiu e violou,
Calou, imolou
Subjugou, manipulou
Condenou, negou,
Tendo a moral de anfitriã.
Duas castas te vestiam:
Ou senhora ou cortesã.
 
Séculos de mordaça
Pariram sufragistas;
Com fórceps de rasgão,
Amamentadas de sangue
Em seio alquimista
De ventre exangue
De poetisa, cientista,
Escritora, Ensaísta,
Médica, artista;
Vestidas de punhos cerrados
Debruados pela determinação
De desabotoar a camisa
E seduzir com o seu NÃO
 
Somos filhas dessas mães!
Mas a sociedade continua macho:
Macho alfa, poderoso,
Macho de membro ereto,
Macho de tom jocoso,
Macho que herda o passado, ardiloso,
E conjuga-o no politicamente correto.
Ah! Mas somos emancipadas!
Estamos a salvo! Vitória! Vitória!
Mas não é o fim da história…
 
Incendiámos soutiens!
Queimámos humilhação em público!
Hipotecámos ao voto a liberdade,
E conquistámos amanhãs,
Na promessa do amor bíblico
De sermos amadas em equidade.
 
Quando é que finamente teremos
O nosso seio a salvo?
Resgatada a essência do que se quiser
De feiticeira, de deusa, de vida,
De terra, de alma… De mulher?!
 
Emancipação…
Temos a sociedade à perna:
- Como assim?! Não quer estudar?!
- Como assim, doutoramento?!
 
- Como assim só quer ter filhos?!
- Como assim nem um rebento?!
 
- Como assim, tempo para educar?!
- Como assim, desnaturada, não vai sequer amamentar?!
 
- Como assim cansada para intimidade conjugal?!
- Como assim, oferecida, sempre em pecado carnal?!
 
- Como assim, é mãe solteira?!
- Como assim, vai abortar?!
 
- Como assim, que quer casar?!
- Como assim vai-se juntar?!
 
- Como assim, que desmazelo…
- Como assim, que pinta os olhos, e até pinta o cabelo?!
 
- Como assim, violentada, não faz queixa, não faz nada?!
- Como assim, divorciada?!
 
- Como assim, está na cozinha?!
- Como assim, que não cozinha?!
 
- Como assim, como assim, como assim?!...
- Uma vida inteira de tanta emancipação a provar?!
 
Hoje somos mães, senhoras, cortesãs,
Gestoras, poetisas, amantes, juízas,
Esposas, médicas, artesãs,
E o Ipiranga que nos resgatou à censura
Vestiu-nos com alta-costura
De uma liberdade de sermos TUDO!
TUDO! Com profissionalismo, beleza, desvelo e candura.
Mas… tudo… AO MESMO TEMPO!!!!!
 
A sociedade é que aperta o espartilho
E põe o dedo no laço da escravatura.
Mas que bem que nos assenta a emancipação!
 
In “Pó Ético” de Marta Meireles

29 fevereiro 2024

“Os Reinegros” de Alves Redol - 22 de Março às 20h00

 

A abrir

“Estava ali havia um bom pedaço vindo da esquina até defronte do prédio onde ela servia, enervado de esperar tantos minutos, pois já lhe assobiara o sinal combinado e ela ainda não aparecera, nem sequer à janela, aquietando-lhe a dúvida que começava a preocupá-lo.

Naturalmente dera-lhe trela naquele Santo António por desfastio ou porque a noite convidava à conversa. Abalara até ao Rossio, embora cansado do trabalho do armazém, mas mais cansado ainda dos maus modos dos primeiros-caixeiros, piores no trato do que os patrões, convencidos de que assim chegariam mais depressa a sócios da casa. Encaminhara-se para ali fugindo à solidão do quarto, que lhe aumentava as dores de cabeça que trazia do emprego. Tinham fechado mais cedo, porque os santos eram dias alumiados e, talvez também pelo hábito de sair só depois da uma hora batida, se sentira atraído pelo ruído da rua. Não procurara com quem acamaradar; escusara até, com um pretexto qualquer, a companhia de outro hóspede da casa, entristecido pelas saudades da sua aldeia de mistura com queixumes da vida. Mudara de fato e saíra, metendo no bolso umas moedas para beber o seu copo e arranjar, se calhasse, uma moça para passar o tempo, pois, em noite de bailaricos e fogueiras, as mulheres acessíveis são ainda mais fáceis…”

In “Os Reinegros” de Alves Redol

19 fevereiro 2024

Maiale - Torpedo Humano - a arma secreta da Regia Marina


Ao ler "O Italiano" do Arturo Pérez-Reverte fiquei extremamente curiosa sobre os Maiale. Já tinha ouvido falar sobre estes torpedos humanos, mas não tinha ideia de como funcionavam ou eram operados. Encontrei este pequeno documentário que é bastante esclarecedor.

15 fevereiro 2024

"FERREIRA DE CASTRO - UMA BIOGRAFIA"

 


Apresentação do 1º volume da biografia de FERREIRA DE CASTRO, autoria de RICARDO ANTÓNIO ALVES: Sábado, dia 17, às 16 horas na BIBLIOTECA MUNICIPAL FERREIRA DE CASTRO, OLIVEIRA DE AZEMÉIS.

09 fevereiro 2024

SESSÃO DE APRESENTAÇÃO DO ROMANCE DE CARLOS QUERIDO "ALEGAÇÕES FINAIS"

 

Alguns leitores da Comunidade estiveram na passada sexta-feira, dia 2, no Supremo Tribunal de Justiça. Cumpria-se a apresentação do romance de Carlos Querido a cargo do Juiz Conselheiro Henrique Araújo, presidente daquele Tribunal.

A intervenção de Carlos Querido integrou uma alusão à  Comunidade e à nossa participação em anteriores sessões sobre obras suas, nomeadamente as que tiveram lugar na Feira do Livro em torno do romance histórico “A Redenção das Águas” e da colectânea de contos “Habeas Corpus”.

De “Alegações Finais”, destacamos a lição de vida que o enredo contempla, a história de um advogado, filho de famílias humildes, que não obstante o triunfo profissional não logrou alcançar uma vida feliz face a desvios de carácter que lhe arruinaram o casamento. O romance desenvolve-se segundo um registo de escrita em que a voz do narrador se confunde com as das personagens e as suas correntes de consciência. Julgamos surpreender muitas das preferências artísticas, literárias e musicais do autor frequentemente trazidas ao curso da história. Claro que a actividade profissional de Carlos Querido (juiz desembargador) sente-se presente em todo um conjunto de termos e procedimentos jurídicos que, tratando-se o protagonista de um advogado, dão consistência ao discurso narrativo. Terão tido sucesso as alegações finais da infeliz personagem na sua tentativa de reganhar a harmonia conjugal? O romance não o diz, terminando de uma forma que permite considerá-lo como uma “obra aberta”.  


03 fevereiro 2024

LEITURAS

 


O DRAMA EM GENTE

 

Fingiram todos,

todos me fingiram

e em tradição me deram

fingimento

 

É certo que eram outros

tempos outros,

em que ser muitos

era coisa ausente

 

Mas todos me fingiram

e ensinaram

que o comboio de corda

pode ser

de corda a sério,

 

não de coração

 

Também eu tive,

embora em outra esfera,

outras noites de verão

 

Nada lhes devo

e em tudo, embora,

devedor lhes sou

 

Que os séculos agora

lhes dêem o sossego

 

ou dêem nada –

 

Ou nem que seja

a dor do universo,

como a dor de cabeça

 

infinita, silente,

de que padeço para  sempre

e desde

 

que eles vieram

visitar-me os sonhos

 

- ANA LUÍSA AMARAL, Escuro, 2014

 

 

AUTOPSICOGRAFIA

 

O poeta é um fingidor.

Finge tão completamente

Que chega a fingir que é dor

A dor que deveras sente.

 

E os que lêem o que escreve,

Na dor lida sentem bem,

Não as duas que ele teve,

Mas só a que eles não têm.

 

E assim nas calhas da roda

Gira, a entreter a razão,

Esse comboio de corda

Que se chama coração.

 

- FERNANDO PESSOA, Presença, nº 36, Novembro de 1932


01 fevereiro 2024

“O Italiano” de Arturo Pérez-Reverte- 23 de Fevereiro às 20h00


Abri ao acaso e li: 

“… Elena atravessou, está dentro da colónia. Fê-lo às primeiras horas, ao abrir da fronteira. Andou a fazer tempo nas proximidades enquanto tomava um café – mais chicória do que outra coisa – num pequeno quiosque situado junto da fronteira até que viu aparecer o doutor Zocas, que naquela manhã tinha servido no Colonial Hospital. Foi ao encontro dele com ar casual, que surpresa, doutor! Et cetera, e assim atravessaram junto a fronteira, a conversar com aparente naturalidade enquanto ela disfarçava a tensão: um olhar rotineiro dos alfandegários britânicos, uma saudação destes a Zocas, o longo percurso através da pista do aeródromo e Casemates Square até se despedirem na Main Street…” 

In “O Italiano” de Arturo Pérez-Reverte

01 janeiro 2024

“Um Deus Passeando pela Brisa da Tarde” de Mário de Carvalho – 26 de Janeiro às 20h00.

 


“…Brilha o céu, tarda a noite, o tempo é lerdo, a vida baça, o gesto flácido. Debaixo de sombras irisadas, leio e releio os meus livros, passeio, rememoro, devaneio, pasmo, bocejo, dormito, deixo-me envelhecer. Não consigo comprazer-me desta mediocridade dourada, pese o convite e o consolo do poeta que a acolheu. Também a mim, como ao Orador, amarga o ócio, quando o negócio foi proibido. Os dias arrastam-se, Marco Aurélio viveu, Cómodo impera, passei o que passei, peno longe, como ser feliz? Mara, mais além, borda, sentada numa cadeira alta de vime, junto aos degraus da porta. Há́ pouco, ralhava com as escravas. Agora ri-se com as escravas. Em breve ralhará com as escravas. Do local em que me encontro não consigo ouvi-la, mas quase adivinho as razões dos risos e dos ralhos. É-me agradável saber que Mara está perto, e reconhecer-lhe tão bem, desde há́ tantos anos, os trejeitos e os modos. Momentos atrás, sem nenhuma razão especial, veio até junto de mim, com o seu animal de regaço que é agora um gato cinzento, depois de, em hora nefasta, ter perdido a rola, muito alva, que lhe vinha comer à mão…”

In “Um Deus Passeando pela Brisa da Tarde” de Mário de Carvalho

31 dezembro 2023

Balanço Anual e Feliz 2024

 

(Cartaz de divulgação da CMC)

2023 veio com nuvens negras a pairar sobre o mundo em geral e em particular na Europa, resultantes de uma grande crise económica e social relacionada ainda com a pandemia do Corona Vírus e, sobretudo, com a guerra Rússia /Ucrânia, cujo final não tem fim à vista. Lá mais para o final do ano outra guerra veio adensar as preocupações e aumentar as angústias globais, com o conflito Israel/Palestina. O mundo está a mudar e não é para melhor e todos estamos envolvidos nessa mudança.

Felizmente, no que toca a esta Comunidade e ao seu amor pelas leituras, a palavra crise não entra neste cenário e arrancámos para mais 365 dias de bons livros. Antes disso, realizámos um animado jantar convívio para celebrar a chegada do novo ano.

Janeiro chegou muito friorento, mas isso não impediu que 17 leitores estivessem presentes na BSDR, para mais uma sessão animada em torno da sátira de André Gide “As Caves do Vaticano”. O primeiro livro do trimestre, que tinha o mote “Romance e Modernismo”, agradou bastante aos leitores (apenas um não tinha ainda terminado a leitura) que se divertiram com as personagens criadas pelo escritor francês. Partindo de um rumor de que o Papa tinha sido sequestrado, Gide constrói uma trama, em que um grupo de vigaristas tenta ganhar dinheiro para libertar o Pontífice. Uma rede de personagens algo perturbadoras, cujos sentimentos e escolhas apontam a uma crítica social e moral, ajudam a construir uma estrutura narrativa aliciante, que à época entrou na lista negra da igreja católica. Para nós foi mais uma boa opção de leitura.

Em Fevereiro fomos à descoberta de um daqueles autores que todos conheciam, mas que poucos tinham lido: James Joyce e o seu “Retrato do Artista quando Jovem”. Foi uma leitura corajosa, tendo em conta as dificuldades que a maioria encontrou pelo caminho. No entanto, a história (que todos consideram autobiográfica) de crescimento do escritor, que acompanha a sua infância até à idade de jovem adulto, agarrou-nos e não nos fez desistir. Resistimos a todos os considerandos políticos irlandeses e à longa ambiência da educação jesuíta. Os contributos dados pelos leitores na sessão, acabaram por tornar mais lúcida e compreensível a apreciação do romance. Tanto que, houve quem começasse a perfilar a leitura de “Ulisses”. No final ficou uma questão: terá Fernando Pessoa lido James Joyce? Algumas pistas no romance, justificavam a pergunta. Uma investigação posterior confirmou o facto, mas com aparente pouco entusiasmo (na leitura do Pessoa, não na investigação). A sessão contou com 20 presenças e 5 que não tiveram tempo de concluir a leitura.

O trimestre terminou com mais uma densa narrativa introspetiva. O "Jogo da Cabra Cega" de José Régio, tornou longo o mês de Março para a maioria dos leitores. Um romance, também ele autobiográfico, que deixou na maior parte dos leitores uma impressão de cansaço, devido a uma procura do “eu” muito conturbada e por vezes confusa. Régio não foi um escritor de agrado global, mas teve o mérito de ocupar animadamente as duas horas e meia da sessão, levantando muitas questões pertinentes, sentimentos diferentes e reações diversas à leitura. 18 presenças, sendo que, 4 dos participantes, não acabaram a leitura.

O segundo trimestre chegou sob o mote “Romance e Contos de Autores Portugueses”, iniciando em Abril com “Os Amantes e outros Contos” de David Mourão-Ferreira. Os contos foram do agrado geral, embora quase todos reconhecessem alguma dificuldade em seguir o labiríntico pensamento dos mesmos e a utilização frequente do fantástico. Uma escrita escorreita, elegante, delicada e poética foram também alguns dos adjetivos usados pelos leitores. Outros sentiram a leitura como uma espécie de flashes contínuos, a proporcionarem uma experiência cinematográfica em forma de escrita.  Estiveram presentes 20 leitores, sendo que 2 não leram o livro. 

Em Maio, foi a vez do romance de Manuel da Fonseca, “Cerromaior”. Obra do neorrealismo (apesar de questionado pelos puristas do estilo), centra-se numa imaginária vila alentejana, retratando o espaço social, ético e político dos anos 30/40. Da família de latifundiários, classe social dominante, a uma GNR aliada aos poderosos, tudo se conjuga para a exploração do proletariado rural que vive numa constante miséria humana onde tudo falta e nada parece ter futuro. Há, no entanto, alguma réstia de esperança, no facto de Adriano, personagem principal do romance, ter um percurso de crescimento e evolução que o levam a questionar as injustiças sociais e a falta de dignidade existente no tratamento dado aos trabalhadores. 20 presenças e 3 leitores que não leram o romance.

A terminar o segundo trimestre, Junho trouxe-nos “Sombras da Raia” de Nuno Franco Pires. A presença do escritor que amavelmente aceitou o nosso convite, trouxe-nos uma outra dinâmica, acrescentando informação e muitas outras histórias relacionadas com o romance.  Começando com o início da sangrenta guerra civil espanhola (que provocou centenas de mortos em Badajoz), acompanhamos uma história de gerações que atravessa a vida de 3 famílias da raia, entre 1936 e 1918. Entre Badajoz e Elvas cruzam-se os destinos de Clara, Miguel e Inês. Através deles descobrimos uma teia de enganos e segredos, há muito escondidos pelas suas famílias. Um enredo bem trabalhado, com todo um naipe de personagens fortes, dá-nos ainda a conhecer, a evolução da doçaria mais conhecida da região, a famosa ameixa de Elvas. Ficou em aberto a organização de uma deslocação a Elvas, para seguirmos os roteiros que nos são dados a conhecer no romance. 22 presenças e 3 que não leram.      

Julho chegou e com ele demos início ao terceiro trimestre sobre o mote “Romances de Férias”. “Niketche: Uma História de Poligamia”, de Paulina Chiziane, foi o livro escolhido. Uma voz feminina a refletir sobre a condição da mulher moçambicana e a vinculação e submissão a uma sociedade patriarcal muito enraizada, contra a qual é difícil lutar. Uma escrita fluída, por vezes lírica e até bem humorada, a tratar um tema delicado. Uma sessão com bons contributos dos 19 leitores presentes, em que apenas 1 não leu o romance em apreço.

A fechar o mês de Julho e ainda no rescaldo do livro de Maio, um grupo de leitores fez uma visita a Vila Franca de Xira, com particular destaque para o Museu do Neo-Realismo que embora já conhecido pela maior parte da Comunidade, justifica sempre a visita.

Agosto trouxe “Os Anos” de Annie Ernaux, prémio Nobel de 2022. Uma autobiografia num registo muito fotográfico, escrita num formato de pequenos textos que parecem retirados de cadernos diários. Embora com a sua visão muito pessoal, pode dizer-se que é também uma crónica da segunda metade do séc XX focada na vivência francesa, apesar de algumas incursões internacionais. Foi do agrado geral das 20 pessoas presentes, em que 2 não leram o livro.

Em Setembro lemos a “A Trilogia de Nova Iorque” de Paul Auster. Três histórias um pouco sombrias, que nos levam pelo fascinante e misterioso submundo nova-iorquino num formato muito cinematográfico. Quem conhece bem e gosta deste escritor, conseguiu enredar-se facilmente nos labirintos criados por si. Quem teve um primeiro contacto com a sua escrita, sentiu alguma resistência e dificuldade na leitura. 19 pessoas presentes e 6 que não leram.

O último trimestre no ano, cujo mote foi “Outros Géneros”, trouxe-nos em Outubro um livro diferente, mas muito apreciado pela generalidade dos leitores: “O Infinito num Junco” de Irene Vallejo. Uma obra que anda entre o ensaio, o relato ou mesmo uma tese, acaba por ser um romance que nos leva numa longa viagem através do tempo e do espaço, de um objecto criado para transportar as palavras. É um livro sobre a história e a evolução dos livros, da antiguidade clássica até aos nossos dias. 17 pessoas presentes e 4 que não leram.

Ainda em Outubro e na rota do livro lido em Junho, “As Sombras da Raia”, um pequeno grupo desta Comunidade rumou num Domingo até Elvas, tendo seguido os passos de muitas das personagens daquele romance. Como sempre, ficaram memórias boas que vão construindo a história desta Comunidade.

Em Novembro abordámos o teatro, através de uma das tragédias Shakespeariana: “O Rei Lear”. Lear, o monarca que renuncia ao poder, com a intenção de dividir o seu reino pelas três filhas, em função do amor que estas lhe devotam. Gloucester, um conde que vê um dos filhos trair o outro para usurpar o poder. Vaidade, lisonja, adulação, ódio, traição, mentira, loucura fingida, caminham lado a lado com amor filial, razão, lealdade, fidelidade, dever e generosidade. A natureza humana no seu pior e no seu melhor. Uma tragédia, com raios de comédia, sobretudo através das intervenções do Bobo da corte. Apesar da maior parte dos leitores preferir ver teatro a ler teatro, o livro foi bem recebido e do agrado de todos, proporcionando uma sessão agradavelmente participada. 27 presenças e 4 pessoas que não leram.

Para terminar o ano numa forma mais lúdica e poética, continuando no tema – outras leituras-, Dezembro trouxe com ele a poesia de Sophia de Mello Breyner Andresen e o livro “Dual”. Como diz Eduardo Lourenço no prefácio deste livro, “… Sophia foi musa de si mesma e talvez a isso se refira o misterioso e luminoso título Dual, dualismo de natural fusão de duas faces de si mesma…”. A casa, Delphos, o mar, os nossos poetas, a mitologia grega e a memória, entre outros, espelham-se ao longo da poética de Dual. No início da sessão questionava-se se a escolha de um livro de poesia teria sido acertada e que tipo de discussão daí poderia surgir. Os 21 leitores presentes (onde apenas 2 não leram) não desiludiram e todos tiveram algo a dizer e também a aprender, com esse Universo único que é Sophia.

E foi assim este ano de leituras partilhadas, num entusiasmo permanente dos muitos leitores que mensalmente marcaram presença nestas sessões. A Comunidade está de boa saúde e tem crescido com a chegada de novos leitores ao longo do ano.  Como sempre, cumpre-nos agradecer à Biblioteca de São Domingos de Rana e aos seus responsáveis, a cedência do espaço, a sua disponibilidade e apoio imprescindível.

Bom Ano 2024!

04 dezembro 2023

PROGRAMA DE LEITURAS PARA 2024

Imagem: FREEPIK
 

= TALVEZ ROMANCE HISTÓRICO

- JAN 26  Um Deus Passeando pela Brisa da Tarde, de Mário de Carvalho

- FEV 23  O Italiano, de Arturo Pérez-Reverte                        

- MAR 22  Os Reinegros, de Alves Redol   

 

= NOS 50 ANOS DO 25 DE ABRIL

- ABR 26 Portugal, a Flor e a Foice, de J. Rentes de Carvalho

- MAI 31 Os Meninos de Ouro, de Agustina Bessa-Luís

- JUN 28 Os Memoráveis, de Lídia Jorge

 

= ROMANCE! ROMANCE! ROMANCE!                           

- JUL 26 Justine, de Lawrence Durrel

- AGO 30 Praça do Rossio, Nº 59, de Jeannine Johnson Maia

- SET 27 Berta Isla, de Javier Marías

 

= OUTROS GÉNEROS

- OUT 25 A Festa de Babette, de Karen Blixen

- NOV 29 Pura Memória, de Emília Amor

- DEZ 27 O Eremita Viajante, de Matsuo Bashô


02 dezembro 2023

MEDITAÇÃO DO DUQUE DE GANDIA..., Sophia - Dito por RITA LOUREIRO


MEDITAÇÃO DO DUQUE DE GANDIA SOBRE A MORTE DE ISABEL DE PORTUGAL

 

Nunca mais

A tua face será pura limpa e viva

Nem o teu andar como onda fugitiva

Se poderá nos passos do tempo tecer.

E nunca mais darei ao tempo a minha vida.

 

Nunca mais servirei senhor que possa morrer.

A luz da tarde mostra-me os destroços

Do teu ser. Em breve a podridão

Beberá os teus olhos e os teus ossos

Tomando a tua mão na sua mão.

 

Nunca mais amarei quem não possa viver

Sempre,

Porque eu amei como se fossem eternos

A glória, a luz e o brilho do teu ser,

Amei-te em verdade e transparência

E nem sequer me resta a tua ausência,

És um rosto de nojo e negação

E eu fecho os olhos para não te ver.

 

Nunca mais servirei senhor que possa morrer.

Nunca mais te darei o tempo puro

Que em dias demorados eu teci

Pois o tempo já não regressa a ti

E assim eu não regresso e não procuro

O deus que sem esperança te pedi.

 

SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN, Mar Novo (1958)


“Dual” de Sophia de Mello Breyner Adresen - 29 Dezembro às 20h00

 


"Altas marés no tumulto me ressoam

E paredes de silêncio me reflectem."


A terminar um ano rico de leituras, a bela poesia da Sophia.


24 novembro 2023

Rei Lear - um outro olhar


As três filhas do Rei Lear – Gustav Pope (1831-1910)


 Kent defende Cordélia – autor desconhecido. Séc XVIII

 

A despedida de Cordélia – Edwin Austin Abbey (1852-1911)

 

Rei Lear chora sobre o corpo de Cordélia, James Barry (1741-1806)

13 novembro 2023

A poesia na nossa Comunidade

 



No próximo dia 17 de Novembro, na Universidade Lusófona, o nosso amigo e coordenador Manuel Nunes, apresenta mais um livro de poesia. Divulgo e deixo o convite. Parabéns e muito sucesso, Manuel!

02 novembro 2023

“O Rei Lear”, de William Shakespeare - 24 de Novembro às 20h00

 


Em Novembro mergulhamos no universo dramático de Shakespeare. O Rei Lear leva-nos às profundezas da natureza humana, aos seus vícios e defeitos, mas também às suas melhores virtudes. Sentimentos como a crueldade, o ódio e a traição, entre outros, andam de mãos dadas com a lealdade, a devoção e o amor…

08 outubro 2023

AO SOL DA RAIA


Na sequência da leitura de Sombras da Raia, a Comunidade foi a Elvas. Um pequeno-grande grupo de 12 leitores. Aí fica o testemunho sumário nestas fotos. Acabámos na Casa da Cultura (antigos Paços do Concelho, edifício de 1538 do arquitecto Francisco de Arruda) onde se inaugurava a exposição Os Dois Lados, do artista JOÃO PEIXE: 17 trabalhos em madeira que vão estar patentes até 11 de Novembro. Expressão artística inabitual de grande sensibilidade e valor. 

02 outubro 2023

“O Infinito num Junco” de Irene Vallejo - 27 de Outubro às 20h00

 


Um livro sobre a evolução dos livros, uma longa viagem pela rota de um objecto, criado para transportar as palavras através do tempo e do espaço…

01 setembro 2023

“A Trilogia de Nova Iorque” de Paul Auster – 29 de Setembro às 20h00

 


A Trilogia de Nova Iorque, inclui os contos Cidade de Vidro, Fantasmas e O Quarto Fechado à Chave. São três histórias misteriosas no fascinante submundo de Nova Iorque.

26 agosto 2023

Les Années Super 8 (Os Anos do Super-8) (2022) (Legendado/Subtitled) (Br...


Para quem se interessou, aqui fica a ligação ao filme da Annie Ernaux, que só se consegue ver diretamente no YouTube...

02 agosto 2023

“Os Anos” de Annie Ernaux - 25 de Agosto às 20h00

 


Sinopse

Estendendo-se por um período que vai de 1941 a 2006, em Os Anos conta-se uma história que é simultaneamente coletiva e pessoal, transversal e intimista, de sessenta anos da vida de um país e da vida de uma mulher. Através de pequenos fragmentos narrativos, por meio da relação entre fotografias, canções, filmes, objetos ou eventos da história recente, mais do que uma desconcertante autobiografia, Annie Ernaux constrói uma recordação de um «nós», num relato sobre o que fica quando o tempo passa: «Tudo se apagará num segundo [...] Nem eu nem mim. A língua continuará a pôr o mundo em palavras. Nas conversas à volta de uma mesa em dia de festa seremos apenas um nome, cada vez mais sem rosto, até desaparecermos na multidão anónima de uma geração distante.»

01 julho 2023

“Niketche: Uma História de Poligamia”, de Paulina Chiziane - 28 de Julho às 20h00

 


Sob o mote -Romances de Férias- iniciamos o 3º Trimestre com a escrita de Paulina Chiziane e a história de Rami e o caminho que vai percorrer ao descobrir a poligamia do marido.

03 junho 2023

“Sombras da Raia” de Nuno Franco Pires – 23 de Junho às 20h00

 


De 1936 a 2018 existem segredos ocultos nas sombras da raia (Badajoz e Elvas) e uma teia de mentiras e enganos guardados por três famílias ao longo de gerações. São essas as histórias que vamos descobrir com a leitura do mês de Junho, cuja sessão contará com a presença do autor, Nuno Franco Pires.

01 maio 2023

“Cerromaior” de Manuel da Fonseca - 26 de Maio às 20h00

 


"….Puro e sem pecados, o coração batia-lhe. Ergueu-se. Ia caminhar. Visíveis, à sua volta, os pobres que tapavam o portão do quintal, Doninha, Zé da Água, Tóino Revel, Bia Rosa, Inácia, Antoninha, Maltês e os ceifeiros da Fonte Velha seguiam-no. Ao lado, passo a passo, a mãe ia também - nem ele sabia para onde, mas tinha a certeza de que era para uma planície de fartura e paz."

In “Cerromaior” de Manuel da Fonseca

01 abril 2023

Os Amantes e outros Contos, de David Mourão-Ferreira - 28 Abril às 20h00

 


No 2º Trimestre, sob o mote “Romance e Conto de Autores Portugueses”, iniciamos em Abril com Os Amantes e outros Contos, de David Mourão-Ferreira.

01 março 2023

"Jogo da Cabra Cega", de José Régio - 31de Março às 20h00

 


Do romance que escreveu em 1934, início da sua carreira literária, José Régio disse mais tarde: «…É um livro de abandono e excesso, em que o escritor estava ainda muito adolescente. Não pense que o desestimo, gosto muito de o ter escrito com aquela coragem quase inconsciente...».

02 fevereiro 2023

"Retrato do Artista quando Jovem" de James Joyce - 24 de Fevereiro às 20h00



Continuando no âmbito do "Romance e Modernismo", este mês vamos seguir James Joyce e as suas inquietações e tomadas de consciência do caminho que pretendia percorrer.

02 janeiro 2023

“As Caves do Vaticano”, de André Gide - 27 de Janeiro às 20h00

 

E se o Papa fosse secretamente sequestrado? É isso que vamos descobrir, neste romance provocador, satírico e crítico…

31 dezembro 2022

Balanço Anual e Feliz Ano Novo

 

Imagem daqui 

O ano de 2022 chegou, ainda sob a tempestade pandémica do Corona vírus, mas já com alguma luz ao fundo do túnel. O sucesso da vacinação, aliado à menor perigosidade das mutações do vírus, apontavam no sentido de um cenário endémico.

Para o 1º trimestre, sob o tema “Horas do Conto”, janeiro trouxe os “Contos Exemplares” de Sophia de Mello Breyner Andresen. Estiveram presentes 19 participantes, dos quais, apenas 1 não leu o livro. Este, reúne sete contos de alguma temática recorrente em Sophia, nomeadamente os valores cristãos e a repressão salazarista. As histórias são apresentadas, não de forma agressiva, mas subtilmente, quase com encanto e algum misticismo e sobretudo com muitas metáforas, onde Deus e o Diabo ou o Bem e o Mal, se escondem nas diferentes personagens. Dadas as contribuições de todos os presentes, confirmou-se o interesse e o agrado geral nesta leitura.

Em fevereiro lemos “Histórias de Mulheres” de José Régio. A sessão realizou-se no dia 25. No dia anterior, a Rússia invadiu a Ucrânia o que, não sendo propriamente uma surpresa, deixou o mundo em estado de choque. Ninguém queria acreditar numa guerra há muito anunciada.  Afinal o Homem continua a não aprender com os erros e a esquecer rapidamente a História…

Numa sessão que contou com 18 presenças e onde mais uma vez só uma pessoa não leu o livro, a coletânea de contos de Régio proporcionou mais uma reunião animada e participada. Estávamos perante um ambiente ficcional dominado por personagens femininas, cuja acção se desenrola nos anos 30/40 quer em meio rural quer em meio citadino. Todo um conjunto de mulheres ora apresentadas em contexto individual (com uma conduta mais fechada, particular e por vezes grotesca), ora em contexto colectivo (socialmente mais vazias, fúteis e dominadas pela aparência). Todas estas figuras construídas com mestria e a dar forma a histórias curiosas que agarraram os leitores, levando cada um à sua própria interpretação.

Em março terminámos o ciclo dedicado aos Contos, com a Agustina Bessa-Luís e os seus “Contos Impopulares”. Estes contos (catorze), ora muito pequenos ora quase a roçar uma história mais profunda, apresentam um traço comum: uma certa tendência de decomposição. Metáfora para uma sociedade decadente?

Vinte e um membros presentes numa sessão em que foi dito, por exemplo, que: “ler Agustina é como ler uma língua estrangeira”, “as palavras são o corpo das suas ideias”, “mesmo não sentindo uma empatia especial, há que reconhecer a genialidade da sua escrita” ou “é de uma leitura difícil mas, absolutamente cativante”.

Em abril iniciámos o 2º trimestre, sob o lema “A sul da américa, a oeste do sonho”. O autor escolhido para este mês foi Luís Sepúlveda e os seus romances “História de uma Gaivota e do Gato que a Ensinou a Voar” e “O Velho que Lia Romances de Amor”.

Zorbas, o gato grande preto e gordo e o seu bando de amigos gatos, unem-se num maravilhoso espírito de grupo, para educar e ensinar a voar, a pequena gaivota Ditosa, órfã de Kengah, a sua mãe vítima de uma maré negra. A este grupo junta-se no final um humano “O Poeta”, que dá a ajuda final ao voo inaugural de Ditosa. Sentimentos bonitos como a amizade, lealdade, companheirismo, proteção, confiança, coragem e responsabilidade, entre muitos outros, são a tónica dominante no conto.

“O Velho que lia romances de amor”, fala-nos da paixão pela leitura e é um hino ao amor pela Natureza e sobretudo à floresta Amazónica. António Bolivar não sabia escrever, mas sabia ler. Os seus pertences mais queridos eram dois: uma dentadura postiça e uma lupa que o auxiliava na leitura, dos seus amados romances de amor.

A escrita maravilhosa de Sepúlveda encantou-nos por inteiro. Nesta sessão em que foi finalmente liberada a obrigação imposta pela Pandemia do uso de máscara e em que voltámos a ver por inteiro a cara uns dos outros, estiveram presentes 19 leitores, tendo todos lido os dois livros.

O mês de maio trouxe-nos Mark Twain e as Aventuras de Huckleberry Finn. Descer o Mississipi, primeiro numa canoa, depois numa balsa e logo a seguir numa jangada, percurso constantemente embrulhado em aventuras e desventuras, foi a tarefa a que se propôs Huck, que encontrou no fugitivo escravo Jim, um inesperado companheiro de viagem. Parecendo um romance direcionado para os jovens, ficou a dúvida se estes terão a devida maturidade para entender o mesmo. Catorze presenças e um que não leu, foi a estatística registada.

A fechar o trimestre descobrimos em junho o escritor colombiano Juan Gabriel Vásquez e uma história que nos levou ao mundo dos emigrantes alemães chegados à Colômbia alguns anos antes da II Guerra Mundial. “Os Informadores” é uma história que nos fala de memórias, de dilemas éticos, de culpa, de invasão do passado no presente e sobretudo de redenção e perdão. Numa sessão em que estiveram presentes apenas 13 elementos, dois dos quais não leram o livro, o romance de Vásquez foi bem acolhido tendo proporcionado ótimos momentos de leitura.

 

No terceiro trimestre e de acordo com o tema “Há mais Mundos”, escolhemos livros de que toda a gente fala, mas que muitos nunca leram. Em julho “As Viagens de Gulliver”, de Jonathan Swift e em agosto “Alice no País das Maravilhas” de Lewis Carroll, transportaram-nos a mundos de fantasia e sonhos. O primeiro é uma espécie de comédia incompreendida e o segundo aproxima-se de uma narrativa com carácter de absurdo, sempre a contornar as regras da lógica. Cerca de uma vintena de participantes em ambas as sessões, divertiram-se a escrutinar setas fantasiosas aventuras. Em setembro, o grande clássico da ficção científica “A Guerra dos Mundos”, de H. G. Wells, deu luta na discussão, enriquecida pelas diferentes opiniões dos leitores presentes. Uma conclusão comum foi a de que, o ser humano perante o desconhecido, o medo e a histeria coletiva, perde a sua humanidade e pode tornar-se selvagem. Dezanove leitores presentes, tendo todos lido o romance.

Com outubro chegou o 4º trimestre, sob o mote “Saramago e Saramaguianos”. Iniciámos com o “Manual de Pintura e Caligrafia, de José Saramago”, discutido numa sessão onde estiveram presentes 20 leitores e apenas um, não leu o livro. Embora este seja o segundo romance de Saramago é já um tratado de bem escrever, um longo caminho de autoconhecimento e uma viagem pelo mundo da arte. Ninguém ficou indiferente à beleza da escrita e à sua peculiaridade. Diz o narrador em determinado momento “…É sobretudo a ideia do prolongamento infinito que me fascina…” A nós, o romance fascinou-nos do início ao fim.

Em novembro lemos “Os Malaquias”, de Andréa del Fuego. Acompanhámos a insólita história da família Malaquias, numa paisagem rural transformada pela construção de uma barragem. Romance áspero, mas ao mesmo tempo poético, salpicado de algum realismo mágico, onde a morte anda de mãos dadas com a vida. Dezassete leitores presentes e todos leram o livro. Uns ficaram encantados outros nem tanto, o que, como sempre, apenas serviu para enriquecer a discussão.

Dezembro chegou e com ele o último livro do ano “Os Transparentes”, de Ondjaki. Uma história centrada num prédio de Luanda, onde, quer os seus habitantes, quer quem por lá passa, enfrenta a dura realidade diária, entre uma alegria genuína e uma melancolia persistente. Os dramas de cada um cruzam-se com os dramas alheios, criando um complexo enredo de histórias impensáveis. Uma escrita lírica, mas mordaz e satírica, a revelar a realidade quotidiana da cidade e das suas pessoas. Ficou a pergunta: quem são os transparentes? Aqueles que pela sua insignificância não são vistos ou aqueles que pela sua pobreza se tornam invisíveis? Dezassete pessoas presentes, cinco que não leram ou ainda com a leitura em curso. Um livro que foi do agrado de todos os presentes.

E foi assim mais um ano rico de partilhas literárias, sempre com muitos leitores presentes, confirmando que a Comunidade de Leitores está viva e recomenda-se. À nossa Biblioteca e aos seus responsáveis, o nosso agradecimento pela disponibilidade do espaço e apoio permanente.

A todos um Feliz 2023!