08 maio 2011

VILA NOVA E PORTALEGRE

Há um amigo que, ao que tudo indica, virá de Vila Nova, concelho de Miranda do Corvo e distrito de Coimbra, para se juntar ao grupo de leitores na sua visita a Portalegre.
Vila Nova é uma freguesia onde Miguel Torga exerceu medicina pouco depois de 1933, ano em que se licenciou. Na sua autobiografia romanceada, “A Criação do Mundo”, são referidas, sob o topónimo fictício de Sendim, as condições difíceis que rodearam esse exercício profissional, desde a fraca compensação material que obtinha à maledicência dos médicos instalados que não apreciavam a concorrência do novo colega.
Portalegre, por sua vez, é uma cidade do Alto Alentejo onde durante mais de trinta anos José Régio foi professor de liceu e escreveu o fundamental da sua obra.
Torga e Régio zangaram-se em 1930, aquando da cisão da revista "presença", e nunca mais fizeram as pazes.
Assim, não deixa de ser curioso que este nosso amigo – que felizmente não está zangado connosco! –, venha de Vila Nova para viajar com o grupo até Portalegre, como se fosse o espírito de Torga a vir ao encontro do de Régio numa reconciliação que nunca chegou a acontecer.
Diz-se que a literatura é imitação da vida com a criação que faz de mundos possíveis, mas eu, não discordando disso, acho que muitas vezes ela é mais que imitação, é a própria invenção da vida. Pode parecer coisa estranha e sem sentido, mas pensei nisto a propósito deste amigo que vem de Vila Nova para se juntar a nós numa viagem a Portalegre – cidade do Alto Alentejo cercada de serras, ventos, penhascos, oliveiras e sobreiros.

11 comentários:

Custódia C. disse...

Este amigo é mais do que bem vindo ou devo dizer ... bem regressado?
Entre Vila Nova e Portalegre a distância faz-se curta!

João António disse...

A Literatura é também o lugar de realização da vida e da sua invenção, quando nos deixamos interpenetrar pelos seus eflúvios nos momentos significativos das nossas experiências directas. Torga e Régio, dois vultos maiores dessa galáxia, com a sua palavra poética-percutiva, têm força catalizadora entre os leitores, capazes de os aproximar entre si.

Maria Amélia disse...

Em Portalegre, cidade
Do Alto Alentejo, cercada
De serras, ventos, penhascos, oliveiras e sobreiros
Morei numa casa velha,
À qual quis como se fora
Feita para eu Morar nela...

Meus queridos, eis aí um poema que me corre nas veias, desde que, há muitos anos, o ouvi declamar por João Villaret...muitas vezes desejei repetir a experiência, e até tentei, com a Sofia. Mas não era a mesma coisa, havia algo naquela voz perdida, nessa voz o poema era mesmo uma "toada"...
É loucura pensar que podemos levá-lo connosco para Portalegre e, se porventura se proporcionar, o lermos à vez? Ou sou só eu que vibro com este vento suão, cujo contrário também de certa forma nos traz uma semente, um amigo tão desejado?

D. Gil Cogominho disse...

Ler à vez? Sim, talvez não seja má ideia - são 246 versos!

D. Gil Cogominho disse...

Claro que não dispenso o mestre de trovas.

Manuel José disse...

Caro João António,
Palavras exemplares! Não há trabalho por mais rude que consiga obnubilar o espírito.

Manuel Nunes disse...

Maria Amélia,
Candidato-me a ser um dos leitores.

Maria Amélia disse...

Levanto os olhos (doridos) do árduo trabalho, também o literário (ou pretensamente tal), e eis que se me deparam importantes personagens formando fila para a proposta declamação... Quem dá mais?

Joca disse...

Com tão movimentado blog, quase me distraio em banais coisas como o trabalho, e eis que, de repente, se forma uma turba ululante de declamadores. E eu, que pouco sei do mister do dizer, atrevo-me a murmurar (também eu, também eu, ousarei ler em voz alta o que me propuserem). Eu, fidalga sempre aprendiz de tudo, entregarei ao vento suão as palavras régias de um poema.

Custódia C. disse...

Se eu puder escolher a minha estrofe... gostaria de interceder por um certo craveiro, onde uma cepa cansada, mal dava cravos sem vida ...

Maria Amélia disse...

Depois de tantas expectativas, eis que se iam esgotando as oportunidades...Obrigada, Custódia, pela ajuda!
E obrigada aos nossos declamadores-joão, Joca, Manuel e Custódia- foram óptimos! O momento mágico que criaram correspondeu exactamente ao que tanto desejava.