Blogue da Comunidade de Leitores da Biblioteca de S. Domingos de Rana - Cascais - Portugal
29 julho 2012
O Príncipe, de Maquiavel, sexta feira, 31 de Agosto, às 21H
Continuamos nos clássicos.
O mês de Agosto de 2012 vai ser diferente, com esta leitura que nos leva ao mundo do pensamento político.
"Aqueles que desejam conquistar o favor de algum príncipe costumam apresentar-se-lhe com os bens que mais prezam ou com aqueles que crê em dar-lhe maior prazer."
Este foi o legado de Nicolau Maquiavel ao Magnífico Lourenço de Médicis, e também ao mundo que se interessa por política.
27 julho 2012
A LAMENTAÇÃO DE PROCUSTO
A LAMENTAÇÃO DE PROCUSTO
I
Reconheço os crimes que cometi, o terror que
espalhei pela Ática, infligindo aos viandantes os suplícios do leito. Via-os
chegar exaustos ao cais do porto onde os esperava, queimados de vento e
pó, as sandálias e as túnicas desfeitas,– de bom grado
aceitavam a miragem de repouso que lhes prometia.
II
Confesso que sofria.
Perturbava-me a impiedade dos deuses, o fogo sombrio da
desigualdade nos olhos dos homens, o rápido fluir da vida sob as pontes
do destino absurdo. Mas o mal que pratiquei nunca me
concedeu a satisfação, nunca tive prazer em ver no rosto das vítimas o reflexo
cruel do pavor sem limites: fiz apenas o que estava destinado
fazer-se desde o princípio dos tempos.
III
Capturou-me Teseu numa vereda que levava a
Elêusis. O dia era uma promessa de luz e havia no ar um cheiro
brando a pinheiros. Eu tinha os olhos rasgados de viandantes e as mãos tolhidas
de sangue.
IV
Morri no suplício do leito, mas os meus membros
decepados, vivos em metáforas, atravessaram o martírio da História
por séculos de luz e de trevas.
V
Bastava o frio castigo de Teseu e a mortalha de
silêncio sobre o meu ser desprezível: a moeda ao barqueiro, o rio
sem regresso. Teria descido em paz ao reino das sombras, aliviado
dos meus crimes e da tirania dos deuses. Teria
descansado, enfim, no leito do olvido.
MANUEL NUNES; DISPERSO ESCREVEDOR, SEXTA-FEIRA, FEVEREIRO 17, 2012
LER OS CLÁSSICOS
A Iíada é o primeiro livro da literatura
europeia e, sob certo ponto de vista, nenhum outro livro que se lhe tenha
seguido conseguiu superá-lo— nem mesmo a Odisseia. Lida hoje, no século XXI
depois de Cristo, a Ilíada mantém inalterada a sua capacidade esmagadora de
comover e perturbar. As civilizações passam, mas a cultura sobrevive? É nesse
sentido que parece apontar a mensagem deste extraordinário poema. Ler a Ilíada
é reclamarmos o lugar que por herança nos cabe no processo de transmissão da
cultura ocidental: cada novo leitor acrescenta mais uma etapa, ele mesmo um
novo elo.
HOMERO- Ilíada. Trad. Frederico Lourenço, 2ª Ed. Lisboa: Livros Cotovia, p. 7 (da introdução)
23 julho 2012
OS MITOS (4)
Teseu castigando Procustes no seu próprio leito. Proveniência: decoração dum domicílio ateniense, cerca de 440-430 a.C. - Bristish Museum.
Um dos mais célebres feitos de Teseu
foi a captura e morte de Procustes [ver fala de Hipólito no Acto I, Cena I de
Fedra], um salteador da Ática que oferecia guarida aos viajantes e depois os
submetia a uma perversa tortura: fazia-os deitar num leito que tinha em sua
casa, e conforme os membros inferiores dos infelizes excedessem ou ficassem
aquém das dimensões desse leito, assim os cortava com a sua afiada espada ou os
puxava com cordas até atingirem a correspondente medida. Teseu infligiu-lhe igual
suplício.
O leito
de Procustes é objecto de frequentes alusões literárias como situação
tirânica, aflitiva ou redutora da liberdade de criação poética.
Um poetastro moderno deu voz a
Procustes, escrevendo algures:
Reconheço os crimes que cometi, o terror que espalhei
pela Ática, infligindo aos viandantes os suplícios do leito. Via-os chegar
exaustos ao cais do porto onde os esperava, queimados de vento e pó, as
sandálias e as túnicas desfeitas,– de bom grado aceitavam a miragem de repouso
que lhes prometia, etc., etc., etc.
22 julho 2012
OS MITOS (3)
Teseu matando o Minotauro. Decoração de uma hídria ática do séc. VI a. C. (Museu Gregoriano Etrusco, Roma)
Teseu, filho de Egeu, libertou Atenas
do jugo que lhe era imposto por Minos, rei de Creta: uma leva anual de jovens
atenienses para servirem de alimento ao Minotauro. Conseguindo entrar no
Labirinto com a ajuda de Ariadne (irmã de Fedra), que entretanto se apaixonara
por ele, matou o monstro.
E quando, graças ao auxílio de uma jovem, a difícil porta,
jamais por alguém trilhada, foi achada recolhendo um fio,
logo o filho de Egeu, raptando a filha de Minos, se fez à vela
rumo a Dia [Naxos]. E nesta praia abandonou, cruel, a companheira.
(Ovídio, Metamorfoses, Livro VIII 172-175)
ARIADNE
A irmã de Fedra segundo John William Waterhouse (escola pré-rafaelita). Pintura de 1898, colecção privada
21 julho 2012
VISITA DE ARIADNE
Lembrara-me
de uma teoria da paixão.
Imagino a
poesia que há no acaso. Este, chamo-lhe sevilha.
Quarenta e
tal graus, o espaço ocre do museu das belas-artes.
Sorriu. Com
olhos de gás e um rio por cima da seda rubra.
Falo-lhe,
então, de marco polo e da invenção do papel,
a monumentalidade
da catedral, o túmulo de colombo.
Disse-lhe,
enfim: “vê como ferve o recorte da giralda”.
Limitou-se a
sorrir. Estendeu um fio no chão.
------ JOSÉ
LAURINDO LEAL DE GÓIS, O Fogo e a
Lágrima, Porto, Campo das Letras, 2003, p. 73.
OS MITOS (2)
Representação do Minotauro num vaso ático de cerca de 515 a.C.
Querendo vingar-se de
Minos, Posídon, deus dos Mares (Neptuno para os latinos), fez Pasífae apaixonar-se
por um belo toiro. Da união ilícita nasceu o monstro Minotauro, figura de toiro
e homem.
Indignado com a
esposa, Minos mandou construir o Labirinto para nele encerrar o fruto do
adultério.
Diz Ovídio nas Metamorfoses, Livro VIII 159-168:
Celebérrimo pelo seu talento na arte da arquitectura, Dédalo
encarrega-se da obra, baralha os sinais e faz o olhar enganar-se
em retorcidas curvas e
contracurvas de corredores sem conta.
Tal como na Frígia o Meandro nas límpidas águas se diverte
fluindo e refluindo num deslizar que confunde, e, correndo
ao encontro de si próprio, contempla a água que há-de vir,
e, voltando-se ora para nascente, ora para o mar aberto,
empurra a sua corrente sem rumo certo, assim enche Dédalo
os inumeráveis corredores de equívocos. A custo ele próprio
logrou voltar à entrada: de tal forma enganador era o edifício.
20 julho 2012
OS MITOS (1)
O rapto de Europa na
moeda grega de 2 euros.
Europa, princesa fenícia, foi raptada e levada para
Creta por Júpiter (gr. Zeus) que para tal se transformou num belo toiro
(Ovídio, Metamorfoses, II 847-875).
Um toiro tão belo e tão manso que a princesa ousou montá-lo.
Da união de Europa com
Júpiter nasceu Minos, rei de Creta, esposo de Pasífae, pai de Andrógeo, Ariadna e Fedra.
12 julho 2012
Novos livros
Carlos Daniel, do Clube de Leitura do
Museu Ferreira de Castro em Sintra, apresenta
o seu romance de ficção histórica, A Morte do Rei de Espanha, na Fnac no próximo dia 15 de
Julho pelas 18h00.
09 julho 2012
Do amor e dos seus demónios
“Fedra”, Acto 2 Cena 5, por Anne-Louis
Girodet de Roussy-Trioson (1824)
Fala Fedra:
"Cruel! Ah! Tu bem me entendeste.
Falei bastante claro p’ra que duvidasses;
Ah! Vais conhecer Fedra em todo o seu furor:
Amo. Amo-te. Não penses que neste instante,
Inocente a meus olhos, me aprovo a mim mesma,
Nem que do louco amor que me turva a razão
Cobarde complacência nutra o seu veneno.
Objecto de infortúnio das iras celestes,
Abomino-me mais do tu me detestas.
As minhas testemunhas são Deuses, os Deuses
Que acenderam em mim fogo fatal à estirpe.
Os Deuses que se gabam da cruel vitória
Sobre este coração duma frágil mortal.
Em espírito, tu próprio, recorda o passado.
Não chegava fugir de ti; cruel expulsei-te.
Eu quis que me julgasses odiosa, inumana;
E, p’ra te resistir, teu ódio provoquei.
Afinal, que lucrei, com inúteis cuidados?
Tu odiavas-me mais, eu não te amava menos ….”
In “Fedra” de Jean Racine, Acto 2 Cena 5 (Biblioteca Sudoeste – Transcrição em versos dodecassílabos portugueses, Posfácio e Notas, António Barahona)
05 julho 2012
UMA HISTÓRIA DE VIDA SOB O ARCO GRANDE DA MORTE
Depois do
filme, ontem, no CCB, duas passagens do livro:
Maio
de 1860
Nunc et in
hora mortis nostrae. Amen. A recitação
quotidiana do rosário terminara. Durante meia hora, a voz calma do Príncipe
havia recordado os mistérios gloriosos e dolorosos; durante meia hora, outras
vozes entremeadas haviam tecido um sussurro ondulante em que sobressaíam as
flores de oiro de certas palavras insólitas: amor, virgindade, morte.
Novembro
de 1862
Duma viela transversal, o Príncipe entreviu
a parte ocidental do céu, ao cimo do mar. Lá estava Vénus, envolta no seu
turbante de vapores outonais. Essa era sempre fiel, esperava sempre por ele nas
suas saídas matutinas em Donnafugata, antes das caçadas, agora depois do baile.
D. Fabrício suspirou. Quando se decidiria
ela a marcar-lhe um encontro menos efémero, longe das imundícies e do sangue,
na própria região das certezas perenes?
- Tomasi di
Lampedusa, O Leopardo, tradução de
Rui Cabeçadas, Livros Unibolso. -
04 julho 2012
Fedra, de Jean Racine, Sexta-feira, 27 Julho, às 21h00
De volta aos Clássicos, entramos na tragédia grega com "Fedra".
Face à dificuldade em encontrarmos disponível o livro de Eurípedes, acabámos por optar pelo de Jean Racine.
Boa leitura!
01 julho 2012
O Mário de Carvalho e a Comunidade
Fotos do nosso leitor Helder Maia
Esplêndida a última Sessão.
Mário de Carvalho veio e enriqueceu a nossa tertúlia com a sua simplicidade,
o seu sorriso e até mesmo alguma surpresa. Falámos de vadios, de histórias
reais, dos clássicos. Vieram a lume os projectos que se viram e reviram e não
se sabe como pegar. Falou-se do novo livro que deverá aparecer lá para
Setembro. Falou-se daquilo que é banal e do que é sublime.
Obrigado ao Mário de Carvalho por ter correspondido ao nosso convite e
ajudar a construir a história da nossa Comunidade.
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