22 janeiro 2020

BESTIÁRIO DE "A SELVA" (2)

«Da água presa, como a do igapó, na concavidade da terra e abandonada pelas outras, que se tinham escoado mal o rio dera em vazar, ficara apenas um charco, onde se recolheram quantas vidas por lá deambulavam.
(...)
Deslizavam também, ondulando para abrir caminho nessa vaza pestilenta, os temerosos puraqués, que tinham sete fôlegos de gato e pele viscosa de enguias.
Firmino aguçou a ponta de pequena vara e com ela fisgou um.
- Não lhe toque, seu Alberto!
- Porquê?
- Vai ver...
Despiu a blusa, numa das mangas envolveu o cabo do seu facão e com a lâmina roçou de leve o dorso do puraqué.
- Agora toque aqui... Mas só com um dedo - e indicava o espigão do terçado, que aparecia na extremidade da madeira. Alberto obedeceu e logo se sentiu percorrido por um forte choque eléctrico.
Firmino sorria e explicava:
- Este bicho é assim. Se um homem tem o coração fraco e lhe toca dentro de água, pode ir para o outro mundo...»

--- FERREIRA DE CASTRO, A Selva, Capítulo VI.

1 comentário:

Custódia C. disse...

É todo um mundo desconhecido que nos chega através da Selva...