A abrir
"O vento mia e rabeia no telhado, abala a casa, parece que leva tudo pelos ares, engolfa-se a espaços pela chaminé abaixo, espevita o lume onde a chaleira canta, vai fazer oscilar a chama do candeeiro de petróleo e arranca-lhe um veuzinho de fumo negro. Algures, uma porta mal engonçada bate no trinco, enfurecida, como se quisesse libertar-se e partir com o vento à grande aventura.
Na mansarda, de outro modo silenciosa, paira uma inquietação. Só ali na cozinha brilha a luz amarela e tranquila, que o abajur de papelão concentra na mesa e na tábua de engomar.Ao lado, pelo respiradouro em ogiva do ferro, espreita um lume quase branco, de inferno em miniatura, que espalha o aroma e o calor reconfortantes do sobro queimado. Alvas de neve e cuidadosamente dobradas, vão-se empilhando na mesa as peças dum minúsculo enxoval..."
Início do conto "O Gato Preto", o primeiro in "A Escola do Paraíso" de José Rodrigues Miguéis
3 comentários:
Já comecei a ler.
Eu também :)
Com tantas leituras em curso, não está fácil arrancar com mais esta, ainda que em segundas "núpcias"... Mas espero que todos apreciem mais esta, a primeira que nos vai fazer dar atenção a Lisboa (seguem-se mais duas, como sabemos, pela mão de um estrangeiro de passagem e depois com o sempre bem vindo Eça).
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