É verdade: não me dou bem com a passagem vertiginosa dos assuntos, embora admire quem assim passa com facilidade de uma coisa a outra, completamente diferente. Defeito ou não, desta vez detive-me a rever mentalmente algumas coisas a propósito de Henrique Pousão e Capri...
Em primeiro lugar, a evocação de Henrique Pousão, trazida aqui a
propósito da exposição do MNAA: o que queria acrescentar é a minha impressão
pessoal, construída sobre os interesses temáticos que me costumam guiar. A
ideia sobre o que foi a sua breve vida, é-nos dada por qualquer pesquisa, ainda
que elementar. Saliento assim apenas alguns pormenores: de aluno brilhante na
Academia de Belas Artes do Porto, passa, por concurso, a pensionista do Estado
no estrangeiro (as atuais e famigeradas Bolsas...), para completar a sua
formação. Parte para Paris em 1880, mas "demora-se quatro dias em
Madrid, para apreciar as obras dos grandes mestres no Museu do Prado"
(quem sabe não se terá detido frente aos mesmos quadros que nos fascinam hoje,
aqui tão perto? A especialização dele era a paisagem!). É precisamente na
sequência do rigoroso inverno parisiense que H.P. adoece, para, praticamente,
nunca mais recuperar inteiramente. Trabalha desalmadamente, pois consegue entrar na École de Beaux Arts e os concursos académicos não
param. Aconselhado a voltar a Portugal, sai de Paris e, após estanciar ainda em França, em Dezembro de 1881 já está em Roma, de onde partirá para Capri. É então nesta ilha, refúgio já famoso de muitos artistas e onde voltará em 1883, que ele produz uma parte (talvez a mais importante) da sua obra. Os exemplos já foram aqui exibidos; o que gostava de salientar é a extraordinária sensibilidade e intuição que o artista demonstra para a paisagem urbana ou humanizada e para a arquitetura, utilizando os assuntos para aprofundar as pesquisas sobre a relação entre a matéria e a luz. Atente-se que ele está numa ilha extremamente acidentada,-- deslocamo-nos ali praticamente sempre a pique sobre o mar, em vistas abertas sobre o horizonte... E o artista vai voltar as costas a esse horizonte, que apenas lhe vai traçar o limite de paisagens tetónicas, como é o caso de As Casas Brancas de Capri. Esta apetência pela arquitetura já havia sido demonstrada pela classificação final (19 valores) em Arquitetura, no curso da Academia, atribuída a um Projeto de Café Concerto. Mas o seu virtuosismo tudo lhe permitia, conforme a sua obra comprova. Inclusivamente, entre 1879 e 1880 executa, para a revista O Occidente, desenhos de reportagem, que se utilizavam à falta da fotografia na imprensa.
Reservo então para uma próxima oportunidade aquilo que gostaria de expor em 2º lugar... se me permitem.
Fonte: Silveira, C. ( 2010) Henrique Pousão. Quidnovi (Lisboa)
Página de O Occidente, nº 29, 1 de Março de 1979, Hemeroteca Digital
Reservo então para uma próxima oportunidade aquilo que gostaria de expor em 2º lugar... se me permitem.
Fonte: Silveira, C. ( 2010) Henrique Pousão. Quidnovi (Lisboa)
Página de O Occidente, nº 29, 1 de Março de 1979, Hemeroteca Digital
4 comentários:
A evocação que fiz de Henrique Pousão – de bons resultados, como se pode ver – partiu de uma necessidade que sempre sinto de ligar as coisas. A “ligação”, neste caso, estabelecia-se entre um núcleo da exposição do Museu do Prado onde me pareceu não ver a luz de Itália, e essa mesma luz que eu tinha como adquirida nos quadros de Pousão, nomeadamente em Casas Brancas de Capri. Da segunda vez que vi a exposição já não fiquei tão seguro da minha impressão inicial e daí, também, a necessidade sentida de uma terceira vez. Lá irei. Sou lento e, por natureza, um reicindente.
Biografia à parte, parece que sim, que há no artista uma inclinação “arquitectural”. Ou seja, não se limitou a pintar camponeses, como os naturalistas das gerações anteriores (ele já estava em trânsito para as novas escolas), mas trabalhou as casas e a cidade.
Para mim, o mais importante, é ligar a Pintura à Literatura (outra vez as “ligações” – ut pictura poesis) e sentir a diferença artística deste pintor, em que se sente “a poesia álacre, material e precisa de Cesário Verde”, face ao ruralismo de Silva Porto e seus discípulos muito mais próximos dos modelos literários de Júlio Dinis. Acho que isto, sim, interessa muito aos leitores.
Uma adenda :)
Quando digo, a fechar "que isto, sim, interessa muito aos leitores", não quero dizer que o que a Amélia escreveu não interesse igualmente. Só que para quem não é especialista em Arquitectura, Urbanismo, Pintura, Ecologia, etc. (o caso deste pobre comentarista, que, de resto, nem se considera especialista em nada), o mais interessante - já que leitor é ele (e dos que lêem mesmo os livros) - é tentar fazer as pontes entre a Literatura e as outras artes. Este o sentido, como se notará, das ideias expendidas a propósito de Courbet e Eça, também de Urbano e a Ecologia.
Pena é que a nossa amiga Ana Cristina, versada nestes temas da Ecoliteratura, não possa vir à sessão de 31.
Ana Cristina: Parabéns do Blogue pelo dia de aniversário. Vê lá se apareces (isto é meramente retórico; ela nem vem ao blogue :) :) )
Mais uma adenda :) :)
Em relação às senhoras seduzidas,já que ninguém comentou, comento eu aqui:
Como ambas falam bem francês, tenham em a conta a epígrafe da novela do Urbano:
"On n´a droit que sur les choses
pour lesquelles on a souffert"
É profundo!
Obrigado Maria Amélia!
Tenho aprendido muito desde que frequento a nossa Comunidade. E a descoberta de Henrique Pousão, pela mão do Manuel, agora tão bem complementada por ti, é mais uma prova disso.
Fico ansiosamente à espera do 2º capítulo ...
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